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A Última do Português - A que nem Camões contaria… (Vizinha Faladeira - 2017)

A Última do Português - A que nem Camões contaria… (Vizinha Faladeira - 2017)

Sempre que falam do nosso jeito amistoso e do povo ordeiro que somos, fico pensando como sofremos influência de um povo distante, mais precisamente do outro lado do Atlântico.

A mistura de índios, negros e portugueses, por vezes conflitantes, forjou em nós um aspecto suave, com traços de amabilidade e presteza.

Somos gentis e dramáticos, valentes e apaixonados, um povo bonito gente boa mesmo, um bom companheiro à se encontrar em qualquer esquina do planeta.

Gosto de pensar não em colonizadores, mas sim em um povo que mesmo oriundo de além mar, vem viajando conosco há 500 anos!

Quem é esse companheiro que misturou afeto, amizade, religiosidade, e tantos outros cromossomos ao nosso DNA?

Quem são esses destemidos navegantes que atravessaram e continuam atravessando um oceano para morar no Brasil e visitar Portugal?

Os arquétipos que temos com certeza tem uma origem, um início.

Somos frágeis e sentimentais tal como o mais lusitano dos poetas portugueses; Luís de Camões.

Somos de um lirismo musical como o que possui o fado e, sensíveis a batuques e atabaques como os povos do norte da África, os primeiros a chegar na Península Ibérica.

No início, éramos todos índios, depois negros e depois uma gama de descendência de povos, uma palheta genética apurando-se através dos séculos.

Mas a mistura, trouxe-nos mais que a cor morena, que os olhos negros e castanhos…

Trouxe também cultos, costumes e traços que nos deixariam amistosos e receptivos.

Desde que as caravelas, Pinta, Nina e Santa Maria aqui aportaram, construímos uma relação curiosa e por vezes galhofeira com eles.

Nos acostumamos a rir juntos, a comer e beber entre gargalhadas, bravatas…batatas e postas de peixe… Tudo regado em fino azeite.

Dançamos e batucamos juntos numa comunhão de almas de terras tão distantes!

Mas nem tudo é festa! Talvez essa alegria e amabilidade, sejam o remédio que os curou de tragédias e tempos negros na sua trajetória através dos séculos…

Invadidos por várias vezes e pautados por guerras e conflitos, os portugueses tiveram muito que lutar!

Lutaram contra tudo e contra todos, e desumanamente contra a fome, em negros tempos no velho continente.

Travaram batalhas externas e internas, defenderam aquele território com armas, diplomacia, e por vezes, nem tão nobres manobras como o fornecimento de tungstênio aos exércitos de Hitler, diante de iminente invasão germânica.

Olhemos com atenção para este povo que ensinou o gato a comer peixe, navegar olhando os céus entre outras épicas proezas.

De alma inventiva e inquieta, supria sua própria necessidade de existir, com suas invenções, que lhes propiciaram expandir-se e conquistar o mundo novo.

Embarcações, instrumentos, cartas náuticas, balões, armas, etc… Eram necessárias para mantê-los vivos e funcionais, sem atravessar 200 ou 300 anos de marasmo europeu.

Em 1448, Bartolomeu dobra o Cabo da Boa Esperança, e em 1498, Vasco da Gama chega a índia.

As colônias portuguesas do Século XV ao XVIII eram então 13 ao total: Açores, Cabo Verde, Celta, Tanger, Ilhas Canárias, Guiné Bissau, São Tomé e Príncipe, Santa Helena, Moçambique, Macau, Timor-Leste, Brasil e Angola, um conglomerado de nações que enriqueceriam o Império, tornando-o o mais poderoso da Europa de então.

Poder e riqueza, são fatores que despertam cobiça e desafetos até de próprios parceiros fronteiriços.

Nações vizinhas como Holanda, Grã-Bretanha e França se unem e atacam colônias portuguesas, causando profundas feridas no Império levando-o ao seu declínio.

Em 1571, o português chegou a Nagasaki, no Japão e ao Tibet, o poderio de comercialização marítima que possuíam, espalhou especiarias mundo afora, e a expansão continua…

Era sem dúvida, o maior monopólio de comércio consolidado.

Oriente Médio, Índia e Ásia.

Logo pudemos perceber o estopim que motivou revolta nas nações vizinhas a Portugal.

Os portugueses desde o início, anunciavam-se uma nação de conquistas, capazes de aventurarem-se aos quatro cantos da terra, sem que lhe fossem impostos limites ou regras.

Além de no primeiro plano causar admiração e espanto, causaria também coligações oriundas de interesses econômicos, como o período em que Portugal e Espanha eram regidos por uma só coroa, de 1580 a 1640, para finalmente debutar num conflito em 1659, em que a diminuta cidade de Elvas resistiria a costumeira invasão pelo leste do império espanhol; se houvesse perdido essa guerra era possível que perdesse também sua maior colônia, o Brasil.

Assim, entre guerras, velas, vinhos, guitarras, esse povo mourisco atravessa os séculos.

Conflitos posteriores, ditaduras e outros incidentes, acometeriam os lusitanos, mas bravamente eles os venceriam através de sublimes atos e atitudes como a conquista da democracia em 1974 com a Revolução dos Cravos.

Apesar do peso do comércio escravatício lhe cair sobre os ombros, os portugueses contemporâneos são declarados amigos dos negros em todo o mundo, e na Europa nossa segunda pátria, calorosa e receptiva.

Aliado da modernidade e tecnologia, os portugueses de hoje tornaram-se um povo alegre e simpático, com laços diplomáticos e fraternos com a grande maioria de suas ex-colônias, e diplomacia aberta à todas as nações do planeta.

Ainda assim, com pouca perícia, não conseguem desvencilhar-se de uma boa piada brasileira.

A galhofa e descontração portuguesa nos contagiou, e sem dúvidas em certas ocasiões o feitiço vira contra o feiticeiro deixando-os embaraçados diante de nossas piadas e espontaneidade costumeiras.

Fica portanto não só uma homenagem, mas uma leitura verdadeira e lúdica, que não lhes imputasse culpas e nem lhes dessem frágeis defesas.

Que possamos vê-lo, lê-lo com olhar ambíguo e não crítico, como um simples encontro com um companheiro de quinhentos anos, que encontramos agora, novamente nas esquinas do samba!!!

Que nossa agremiação A. R. E. S. Vizinha Faladeira torne-se forte e coesa, responsável e amiga, amistosa como somos nós!!!

Que os arquétipos herdados de nossos irmãos lusitanos não deixem que nos falte a coragem para lutar, a humildade para vencer e a sabedoria para seguir em frente!

“…mesmo quando a luta se anuncia bruta,

ostento aguda impunhadora proa

mas meu peito se desabotoa

e por mais que depressa, a mão cega executa

pois senão, o coração perdoa!”

Rui Guerra

Um fraterno abraço à mais faladeira família do Rio de Janeiro.

Jean Rodrigues
Carnavalesco