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Coluna do Rixxa Jr.

TOP 10 SAMBARIO - SAMBAS-LENÇOL

Na gíria do carnaval, um “samba-lençol” é um samba grande (letra extensa) e que “cobre” todo o enredo. O estilo surgiu em meados da década de 1950, teve seu apogeu na de 1960, esteve praticamente extinto na década de 1970, teve lampejos na virada dos anos 1980/1990 e reapareceu “revitalizado” e com ares pós-modernos nos anos 2000. Obras de caráter proeminentemente histórico, – e irretocáveis do ponto de vista melódico – no entanto, esboçavam versões idealizadas de passagens da História do Brasil.

E o Top 10 Sambario remexe o seu baú e apresenta dez dos mais expressivos sambas-lençol da história do carnaval carioca.

10) “Festas folclóricas do Rio de Janeiro” (Ladyr Goularte – Unidos de Lucas 1967) - Veja a letra

Em seu primeiro ano após a fusão da Aprendizes de Lucas com a Unidos da Capela, a Unidos de Lucas apresentou “Festas folclóricas do Rio de Janeiro”. Com 45 versos, a obra de Ladyr Goularte contava, com riqueza de detalhes, algumas festas do folclore popular carioca (carnaval, festa do divino, congadas, festa da Penha, festejos juninos, etc).

O samba antecedeu ao legendário “Sublime pergaminho”, do ano seguinte. A madrinha da escola, a cantora Elizete Cardoso, interpretou a (ao que se sabe) única versão gravada deste samba.

9) “Iriruama arara-o-ama, por toda eternidade” (Luizinho Oliveira, Henrique Guerra, Élio Sabino, Serginho Mato Alto, Ulisses PQD – União de Jacarepaguá 2005) -  Veja a letra

A primeira década do século 21 assistiu ao renascimento do samba-lençol. A União de Jacarepaguá foi uma das escolas que mais incentivou o gênero. Em quatro carnavais, a “arroz com couve” da Estrada Intendente Magalhães levou para a Marquês de Sapucaí sambas épicos com letras quilométricas e pretensiosas para falar sobre o sonho de voar (2002), bois e vacas (2003), a cidade do Rio de Janeiro (2004) e este, em homenagem ao município de Araruama, na Região dos Lagos (RJ). No encarte, o samba aparece com 33 linhas – mas cada linha acaba valendo por duas.

“Iriruama arara-o-ama, por toda eternidade” é quase um resumo da sinopse, ou um exercício estilístico de como se faz um samba com uma letra gigantesca. Infelizmente, o samba não ajudou a UJP, já que a escola caiu para o B em 2005.

8) “Mitologia, astrologia, horóscopo, uma bênção para o carnaval brasileiro” (Barbeirinho do Jacarezinho, Jorge PI, Serginho da Banda, Macambira, Batista do Jacarezinho, Lúcio Bacalhau – Unidos do Jacarezinho 1989) - Veja a letra

Após o excelente desfile de 1988, que garantiu a subida para o Grupo Especial, a Unidos do Jacarezinho encampou um projeto audacioso para permanecer na elite do carnaval carioca e provar que não era mais uma escola ioiô (já havia subido em 86 e caído em 87). Manteve o bom carnavalesco Lucas Pinto e contratou o experiente e bem-humorado puxador Carlinhos de Pilares para soltar a voz na Sapucaí. No entanto, o Jacarezinho não foi muito feliz ao escolher o samba, apesar da autoria ser formada só por compositores feras e pratas-da-casa.

Com 37 versos, o hino de 1989 despertou o estilo “samba-lençol”, gênero que estava hibernando desde o final dos anos 60. Carlinhos de Pilares comprovou ter um gogó de aço ao levar esta obra de letra enorme e de melodia reta no sambódromo. Primeira escola a desfilar na noite de segunda-feira, o Jacarezinho apenas se arrastou na avenida, antecedendo a apresentação da Imperatriz Leopoldinense, que viria a se sagrar campeã daquele certame.

7) “Tesouro maldito” (Zé Carlos e Gordo – Unidos de Manguinhos 1977) - Veja a letra

Numa das poucas participações em discos oficiais do carnaval, a simpática Unidos de Manguinhos apresentou um típico samba-lençol, em 1977. A composição tem 42 versos, sem muita variação melódica (apenas uma elevada de tom nas quatro últimas estrofes) e refrões de estrutura semelhante. O enredo abordou uma lenda do folclore brasileiro, que data do século 18. O garimpeiro português Manoel Henriques (o Mão de Luva) teria fugido da região aurífera de Minas Gerais a fim de procurar ouro na região do atual município de Cantagalo (RJ). Anos mais tarde, Mão de Luva e seu bando teriam sido capturados e levados presos para Vila Rica. Dizem que o garimpeiro teria enterrado preciosos tesouros em algumas grutas durante o tempo em que agiu na região. Acredita-se que o nome da cidade de Cantagalo deve-se ao fato de que uma expedição organizada para capturar Manoel Henriques teria sido levada ao local de seu acampamento devido ao canto de um galo.

O “Tesouro maldito” caiu como uma maldição para a escola, cujas cores são verde, amarelo e branco. Das 18 agremiações que desfilaram pelo inflacionado Grupo 2 (atual Acesso) naquele ano, a Unidos de Manguinhos chegou em último lugar.

6) “Gabriela, cravo e canela” (Sidney da Conceição, Velha e Geninho – Unidos de São Carlos 1969) - Veja a letra

Trata-se de um belo samba, apesar da letra ser imensa e de difícil memorização. O refrão é curto e simples, e um foi um dos mais populares da história da Unidos de São Carlos. São 39 versos, sendo que a segunda parte é um pouco mais extensa do que a primeira. O enredo é inspirado no romance de Jorge Amado, um dos clássicos da literatura brasileira.

Na estupenda safra de 1969, “Gabriela, cravo e canela” foi um dos destaques do carnaval daquele ano, que rendeu o 6º lugar para a Unidos de São Carlos, “escola-mãe” da atual Estácio de Sá. O samba foi gravado pelo Conjunto Nosso Samba e por Dominguinhos do Estácio, na coletânea de Sambas Enredo, da Sony Music.

5) “Memórias da Rua do Ouvidor” (Ala dos Compositores – Lins Imperial 1970) - Veja a letra

Vinte e um anos antes do Salgueiro apresentar um enredo sobre a Rua do Ouvidor, a Lins Imperial dedicava o seu carnaval a este tradicional local histórico do Rio de Janeiro. E o tema proposto gerou um samba com 39 versos. No selo do disco de vinil, o crédito vai para a Ala dos Compositores (vai ver, quem sabe, cada integrante da ala não contribuiu com alguma estrofe).

O samba se propõe a decantar as memórias da “rua mais fagueira” do Rio de janeiro, como diz a letra do samba. O refrão é muito bom, entretanto, a estrutura longa do samba é impensável para os dias de hoje. Com a Rua do Ouvidor, a Lins chegou em 4º lugar no Grupo 2 (atual Acesso).

4) “História da liberdade do Brasil” (Aurinho da Ilha – Acadêmicos do Salgueiro 1967) - Veja a letra

O enredo “História da liberdade do Brasil” foi baseado no livro homônimo de Viriato Correia, publicado em 1962. Considerado ousado por enfocar um tema com este em plena ditadura militar, o carnaval do Salgueiro – desenvolvido pela intrépida dupla Fernando Pamplona & Arlindo Rodrigues – abordaria os grandes feitos de pessoas que insistiam em lutar por um Brasil melhor. Para retratar mais de 450 anos de lutas, o belo samba de Aurinho da Ilha rendeu incríveis 50 versos, que descrevia com exatidão todos os momentos da luta pela liberdade, exaltando personalidades como Zumbi do Palmares, Tiradentes, Frei Caneca, além de episódios históricos que culminaram em grandes mudanças no País, entre eles, as guerras dos Emboabas, dos Mascates, dos Alfaiates, o Dia do Fico, a Independência do Brasil, a Abolição da Escravatura e, finalmente, a Proclamação da República.

Conta-se que Aurinho escreveu este samba em parceria com outro compositor da Ilha do Governador, o legendário Didi, alter-ego do conceituado jurista Gustavo Adolfo Baeta Neves, que não assinava os sambas que compunha por sua família não aceitar que freqüentasse o mundo do samba e do carnaval. Martinho da Vila regravou “História da liberdade do Brasil” em seu fabuloso disco Rosa do povo (1976).

3) “O Grande Presidente” (Padeirinho – Estação Primeira de Mangueira 1956) - Veja a letra

O título do enredo é “Exaltação a Getúlio Vargas – Emancipação nacional Brasil”, mas o samba ficou marcado para a posteridade com o nome de “O Grande Presidente”. A obra, assinada por Osvaldo Vitalino de Oliveira (nome de batismo do sambista Padeirinho), é um típico samba lençol dos primórdios, quando os desfiles de carnaval apresentavam uma visão idealizada de passagens da História, e (até certo ponto), ufanista, até. A composição exalta as virtudes de estadista de Vargas e em nenhum momento, questiona ou contesta os atos praticados pelo presidente morto dois anos antes. Apesar de curto no formato – apenas 26 versos – o samba é um bom resumo da trajetória política do caudilho gaúcho.

O samba enredo “O Grande Presidente" foi gravado por Beth Carvalho no LP de mesmo nome em homenagem a Getúlio Vargas, lançado na campanha de Leonel Brizola para as eleições presidenciais de 1989. Também foi gravado por Jamelão (na caixa A Voz do Samba), Mestre Marçal (no disco Sambas-Enredo de Todos os Tempos, 1993) e Martinho da Vila (no álbum Samba Enredo, 1980).

2) “Memórias de um sargento de milícias” (Paulinho da Viola – Portela 1966) - Veja a letra

Em 1966, a Portela já era multicampeã do carnaval carioca. Sob a batuta de Natal, o “homem do braço só”, a águia azul e branco, detentora de 17 títulos, era o inimigo a ser derrotado pelas outras co-irmãs. Nelson Andrade desenvolveu o enredo, baseado no livro “Memórias de um Sargento de Milícias”, escrito no século 19 por Manuel Antônio de Almeida. Assim como o romance, a Portela retratava um Rio que havia ficado no passado.

O samba fora escrito pelo jovem compositor Paulo César Faria, conhecido pelos amigos como Paulinho da Viola, o primeiro e único de autoria deste grande mestre da MPB defendido pela Portela na avenida. A obra tem 45 versos, recebeu nota máxima dos jurados, foi conduzida no desfile por Surica e ajudou a escola a ser campeã do carnaval. O samba foi gravado por Martinho da Vila no ano de 1971. 

1) “Aquarela Brasileira” (Silas de Oliveira – Império Serrano 1964 e 2004) - Veja a letra

Não é exagero nenhum ao considerar Silas de Oliveira (1916-1972) como o “pai” deste gênero apaixonante, que é o samba-enredo. Filho de um professor, o compositor encontrou nos livros de história a linha mestra que nortearia a criação de seus sambas-enredo. Silas usava uma estrutura semelhante à epopéia clássica. Suas canções de carnaval se tornaram grandes sucessos, mesmo fora da avenida. É considerado por pesquisadores como o mais importante compositor de samba-enredo de todos os tempos, mesmo tendo nascido no seio de uma família de protestantes e encontrado uma forte barreira de seus pais para ingressar no mundo do samba.

No ano de 1964, a Império Serrano classificou-se em 4º lugar com “Aquarela brasileira”. Este é considerado, por muitos, como um dos mais bonitos de todos os tempos, sendo, até hoje, um dos mais executados. O curioso é que o samba, quando desfilou em 1964, ganhou nota 8 de um jurado que alegou ter tirado 2 pontos porque a letra não falava em Minas Gerais.

Em 2002, em eleição realizada pelo jornal O Globo, do Rio de Janeiro, com a participação de 70 especialistas, Silas emplacou três sambas entre as cinco primeiras colocações no pleito dos melhores sambas da história do carnaval brasileiro. “Heróis da Liberdade” (1969), em primeiro lugar, “Aquarela Brasileira”, em terceiro, e “Cinco bailes tradicionais na História do Rio” (1965), em quarto.

O samba-enredo “Aquarela Brasileira” foi composto em homenagem à famosa canção “Aquarela do Brasil”, de Ary Barroso. No momento em que a Império Serrano ia entrar na avenida para o desfile, em 9 de fevereiro de 1964, chegou a notícia de que Ary havia acabado de morrer. “Aquarela Brasileira” voltou ao carnaval em reedição em 2004, mais uma vez com a Império Serrano. O samba tirou nota máxima por todos os jurados. O júri do Estandarte de Ouro concedeu a “Aquarela Brasileira” o Estandarte de Ouro de melhor samba, prêmio que Silas, por ter composto seu último samba para o carnaval em 1969, e ter falecido no mesmo ano em que a premiação foi instituída, nunca chegou a receber em vida.

Rixxa Jr.

rixxajr@yahoo.com.br