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Os sambas de 2010 por Chico da Portela

Os sambas de 2010 por Chico da Portela

A Gravação do CD: Desde o início, quando fui informado da modificação nos moldes da gravação, pensei o seguinte: pior do que está não pode ficar. Portanto, sabia que tudo aquilo que iria aparecer seria "lucro" em comparação com as gravações sonolentas dos últimos 10 anos. Os discos de sambas de enredo a cada ano se aprimoravam na busca da transformação em descartáveis. Eu comprava, ouvia uma vez cada faixa, e escondia no fundo do baú. Em 2010 a gravação não é o sonífero das últimas, mas está longe de lembrar o auge das grandes gravações do início da década de 80. Se agora temos baterias mais audíveis e reais, ganhamos de brinde uma aceleração simplesmente lamentável. Na faixa da Vila Isabel, como exemplo, que possui o melhor samba do ano, não entendo o ritmo afrevado... Consegue inclusive ser mais afrevado que das demais. Mas enfim, voltando a análise geral, sinto falta das características peculiares de cada escola. Sinto falta de faixas distintas, com a essência da escola. Vejo uma padronização chata, que já acompanha o gênero nos últimos anos e que se faz presente nas gravações, a de 2010 não foge muito dessa triste regra. Como ponto positivo, a ausência de grandes enfeites, bossas, paradinhas e demais palhaçadas que só atrapalhariam a audição do disco, coisa que aconteceu - como exemplo - no CD de 98. A segunda passagem com o coro também é um ponto a destacar, principalmente na emocionante faixa da Imperatriz. Contudo, como nem tudo são flores, a primeira passada deixa um pouco a desejar, pois a voz do puxador parece estar "abafada" em várias faixas. O ideal seria: 1ª faixa só com o puxador, 2ª puxador mais o coro. Quanto a safra, é de um desnível absurdo. Vila e Imperatriz possuem obras que estão em outro patamar em relação as demais. No geral, a média é bem baixa, como vem sendo nos últimos anos. A diferença é que dessa vez temos duas obras de altíssimo nível, diferentemente de 2009. Sem mais delongas... Nota da Gravação: 7,0 (Chico da Portela).  

1 - Salgueiro - A campeã do carnaval abre o disco com pouco brilho, apesar do potente refrão principal, talvez o mais forte do ano. A letra descreve de maneira razoável o enredo mediano do Renato Lage. Eu, particularmente, não gosto desse estilo solto de tema, com referências a livros famosos e com critérios esquisitos para a escolha das obras literárias. É imprescindível criticar o enredo, pois ele refletiu em uma safra bem fraca, que tinha como destaque absoluto o samba-enredo do compositor bicampeão de 2007/2008 Dudu Botelho e demais parceiros. Infelizmente escolheram 1 refrão e não um samba-enredo, afinal de contas o samba vencedor se resume ao forte refrão principal. O restante da obra se arrasta, culminando em um refrão central péssimo, que só é refrão pela exigência atual de seguir o padrãozinho de 2 refrãos... Até porque não tem força alguma. As reticências continuam povoando os sambas do Salgueiro, como: "Mistérios... Suspense... Emoção". Palavras soltas para abranger a sinopse. Quinho soltando seus cacos habituais, dando gás e a bateria em um ritmo aceleradíssimo e longe da cadência ideal de samba. Mas, se os jurados gostam desse estilo e deram 40 pontos para Tambor, não duvido que consiga as notas 10... Nota do Samba: 8,5 (Chico da Portela).  

2 - Beija-Flor - A escola que desde 1998 passou a investir em um estilo peculiar de sambas (peculiar nos tempos "modernos"), melodiosos, pesados e com letra mais rebuscada, segue a mesma fórmula. Contudo, em 2010 - assim como no último carnaval - errou a mão (muito embora tenha conseguido 40 pontos com "Embala eu babá", o que não significa muita coisa). Percebo que o enredo prejudicou a vida dos compositores. A mistura Egito - Brasília - misticismo rendeu um enredo extremamente confuso, forçado, com ligações estranhas entre esses temas. Por mais que tenham buscado condensar essa confusão na letra, o resultado não foi positivo... E Brasília, cadê Brasília? Está em 5% do samba...A melodia eu, particularmente, considero sonolenta. Acho que essa necessidade de colocar sambas pesados - que não são sinônimos de samba bom - prejudica a escola. Por que não apostar em algo diferente? Cláudio Russo no último carnaval mostrou para a escola como fazer um samba com letra mais curta e melodia mais animada e de grande categoria, uma pena que perdeu a disputa para 2009. Em 2010 a safra era fraca mesmo, das piores dos últimos tempos na escola, portanto o resultado foi justo, já que parece ser o samba que a escola em peso queria. Destaque positivo: final da 2ª parte, a partir do "A flor desabrochou nas mãos de JK", bela variação melódica. Os refrãos poderiam ser mais trabalhados, principalmente o central. Neguinho, como sempre, dando show e melhorando substancialmente a faixa, comprovando que é o melhor intérprete em atividade juntamente com Dominguinhos. Nota do Samba: 8,6 (Chico da Portela).  

3 - Portela - Essa faixa eu preferia me abster de maiores comentários, afinal de contas é um dos piores sambas da minha escola de coração, resultado do "brilhante" enredo . O que falar daquela sinopse em forma de bate-papo? Fico imaginando até hoje a cara dos compositores geniais da brilhante ala de compositores da escola lendo aquilo... Mas, enfim... A safra possuia um samba em termos melódicos bem interessante, do Noca. Quanto a letra, todos eram fracos e com milhares de citações as cores, ao nome, a águia, tudo para levantar o ânimo do componente e motivar a escola diante do enredo "genial". O que falar de "Faz da criança um cidadão positivo pra nação"? É um bom indicador do restante da obra. Alguém consegue entender o "Conquistar o mundo virtual"? E a Portela como "Luz da Ciência"? De fato, é muito profundo para minha vã filosofia. É o pior samba da Parceria do Diogo Nogueira, que começou bem em 2007 com um belo samba, trouxe um mediano para bom em 2008, um mediano para ruim em 2009 e um fraquíssimo em 2010. Não culpo os compositores, nem Silas de Oliveira em parceria com Martinho da Vila conseguiria extrair poesia dessa aridez de tema. Gilsinho merece meus aplausos, tornou a faixa audível e tem uma ótima atuação no CD. A nota só é isso tudo em razão de ser a menor possível nos moldes do julgamento atual. Nota do Samba: 8,0 (Chico da Portela).  

4 - Vila Isabel - Que felicidade! Que samba! Que emoção! Isso sim é samba de VERDADE. Trazendo um ENREDO com letras maiúsculas, a Vila escolheu o melhor samba do ano e de autoria simplesmente do maior compositor da história da escola: Martinho da Vila. Autor de clássicos do carnaval, ele mostrou que continua com a maestria de outrora e presta uma homenagem digna de aplausos de pé ao grande Noel. Totalmente fora do padrãozinho chatíssimo e requentado atual, mas sem abrir mão de uma energia formidável que culmina no simples, direto e empolgante refrão "Tem a energia da nossa Vila Isabel", Martinho trouxe a mais bela obra da Vila dos últimos 15 anos. As diversas modificações que a obra sofreu não tiraram o brilho da mesma. Não tenho dúvida que será o Estandarte de Ouro de 2010. A primeira parte e o "refrãozão" central descrevem toda a vida do poeta com genialidade, na segunda parte vemos uma referência sutil e poética a "passagem" de Noel. Enfim, uma aula de samba. Só peço que não matem a obra com uma aceleração desnecessária, o ritmo do CD não me agrada. Tinga cantou de maneira segura a obra e afastou uma preocupação que eu tinha (do samba não ficar bom na voz dele). Eu, particularmente, preferia o Gera conduzindo... Mas, aí já é sonhar muito... Quero ver qual jurado terá coragem de dar menos que 10 para essa obra do Martinho. Nota do Samba: 10,0 (Chico da Portela).  

5 - Grande Rio - O enredo acerca do Camarote Nº 1, com toques de Caprichosos 2005 para disfarçar um pouco, proporcionou um samba-jingle. Fruto de uma fusão de 2 sambas fracos, o resultado não poderia ser diferente. O refrão principal é bastante adequado a um comercial,uma propaganda na TV, etc. Não é samba-enredo. O refrão central é marcheado. A 2ª parte em termos de letra é caótica, com uma série de títulos de enredo de carnaval sendo jogados sem qualquer nexo... Não entendi a referência a desfiles anteriores ao sambódromo, se diz na sinopse homenagear o aniversário do mesmo... Enfim. Se em 2009 eu gostei muito da escolha da escola, com um samba valente e requintado, em 2010... Ciça, que não podemos negar é um grande mestre de bateria, está agora na escola e deve - lamentavelmente - acelerar a outrora excelente bateria liderada pelo grande mestre Odilon. Com paradinhas, bossas e novidades, pode até trazer uma certa empolgação à avenida. Contudo, o samba é fraquíssimo. Destaque apenas para a sempre louvável homenagem ao mestre Jamelão. Nota do Samba: 8,1 (Chico da Portela).  

6 - Mangueira - Quando soube que a Mangueira homenageria a música, fiquei bastante entusiasmado. Nada melhor que a combinação Mangueira e a música brasileira. Depois da "bola fora" de 2008 quando a escola preferiu falar de frevo que de Cartola, a administração Ivo recoloca a escola nos eixos. Quanto ao samba, é do mesmo estilo dos últimos que a escola vem trazendo, possuindo algumas sacadas poéticas, como a referente ao funk - onde os compositores conseguiram fugir de qualquer coisa coisa mais "bruta" e lançar um "O baile começar e a noite adormecer" - além do refrão central que possuia um belo "Corre e olha o céu em verde e rosa", uma pena que foi trocado para não haver qualquer problema de ordem "técnica". Indubitavelmente, é um samba forte, com 2 refrãos empolgantes e - diante da mediocridade da safra - é um destaque, embora abaixo de Vila e Imperatriz. A referência às músicas, com muitas aspas, tira um pouco o brilho da obra, me parecendo excessiva. O trio de tenores, com 3 cantores de grande categoria, foi uma idéia interessante do Ivo. Na gravação, entretanto, não gostei da confusão de vozes, além da introdução com o Emílio cantando uma musiquinha para lá de brega. Mas, creio que até o desfile tudo estará certo e os 3 se sairão bem na árdua tarefa de substituir Jamelão. Não poderia esquecer, por fim, de louvar o ritmo da bateria da escola no CD. Uma cadência excelente, que espero ser repetida no dia oficial (Sonhar não custa nada). Nota do Samba: 9,2 (Chico da Portela).  

7 - Imperatriz - O fenômeno da temporada de eliminatórias foi escolhido de forma justíssima o samba oficial da Imperatriz Leopoldinense. Samba perfeito tecnicamente, emocionante e que ficou ainda melhor na gravação oficial na voz do grande Dominguinhos do Estácio, que possui uma voz "limpa" e que valoriza cada nota da rica obra. O samba tem um refrão principal fortíssimo, uma letra que narra o enredo com poesia, com delicadeza, com fluidez e que demonstra a categoria dos compositores. O enredo do Max, que a princípio nem me enchia os olhos, subiu muito no meu conceito quando descrito na obra. Ela consegue interligar todos os setores, sem soltar palavras (como fazem nos sambas atuais) e narra o encontro de todos os povos no refrão central, um dos mais poéticos do ano. Não há muito o que comentar, basta apenas apreciar o samba que seria Estandarte de Ouro em qualquer dos últimos anos, mas que teve a "infelicidade" de existir no ano da volta em grandíssimo estilo do Martinho. É a faixa (conjunto: bateria, samba, cantor e coral) que mais me agrada no CD. O "Oh Deus pai, iluminai o novo dia" na voz do coral arrepia qualquer sambista. Nota do Samba: 10,0 (Chico da Portela).  

8 - Viradouro - Forte candidato ao meu "pula-faixa". É o típico samba que não me agrada: não é bom, não é rico, não é animado, não é trash, não é divertido. Enfim, é mediano. A melodia é muito arrastada e na voz do Wander com seus vibratos torna-se ainda mais sonolento. O enredo é muito turístico, muito visual e pouco "sambístico". É ótimo para fazer alegorias e fantasias, mas para fazer samba... O refrão principal da obra cai no lugar comum, com uma citação a elementos típicos do México e um "Arriba" estranhíssimo. A letra no geral é bastante rebuscada, com várias passagens que - novamente - minha vã filosofia não alcança. A escola vai precisar mais do que nunca de sua comunidade, ainda mais com a saída do Ciça, que com a sua bateria, tornava o desfile da Viradouro sempre de certa forma esperado. O final da 2ª parte tem uma variação melódica interessante, talvez seja o único ponto de maior destaque da obra. Nota do Samba: 8,1 (Chico da Portela).  

9 - Unidos da Tijuca - Outro samba que se enquadra no perfil que eu apontei para o da Viradouro, não possui grandes erros, nao é trash, mas não tem nada de interessante e que "grude" no ouvido. Segue o mesmo estilo adotado pela escola desde 2004, muito embora com bem menos brilho que o de 2005, por exemplo, que se não era genial, prendia e nos fazia ouvir diversas vezes. A letra é meio perdida, do nada sai com um "Unidos da Tijuca, não é segredo eu amar você". Gosto muito do Paulo Barros, mas esse enredo dele dificultou a vida dos compositores. Por fim, samba - Bruno Ribas - Tijuca, não formam uma trinca legal. Há algo que não se encaixa, ele não tem o estilo do samba e, muito menos, da escola. Mais um "pula-faixa". Nota do Samba: 8,1 (Chico da Portela).  

10 - Porto da Pedra - Disputa com a Portela o título de pior samba do ano e na minha opinião, consegue a proeza de vencer a primeira nesse tenebroso duelo. O trecho "O homem deu no couro" consegue sintetizar o que penso da obra... A safra foi a pior de 2010 e o samba escolhido não ficou atrás, ganhou esse honroso título. A escola que em 2007 levou uma das melhores obras do ano à avenida e em 2008 conseguiu extrair poesia do Japão e não decepcionou, em 2010 busca o "tesouro" com o "homem dando no couro"... Só tenho a lamentar. Lamento ainda mais pelo Andanças, que é um cantor excelente, de talento inquestionável e tem que cantar essa "pérola" na avenida. A escola vai depender mais uma vez do salvador da pátria Luizinho Andanças, que precisará incorporar Santo Expedito, o Santo das causas impossíveis. O mesmo que falei para a Portela, vale para a escola, só irei dar essa nota porque é a menor possível. Nota do Samba: 8,0 (Chico da Portela).  

11 - Mocidade - Chegamos na melhor marcha do ano. Se querem aprender como fazer um refrão principal vibrante e arrasta-povo escutem a marchinha da Mocidade. Não dá para ficar parado com essa obra, assumidamente "trash" e que dá um chega pra lá nas "serpentes" de plantão que insistem em analisar tudo de maneira muito técnica. No Espaço Aberto do site Galeria do Samba comentei à época da escolha que esse samba quanto mais "esfarrapado", "trash" e "louco", melhor. É exatamente o que penso, é o tipo do samba que é aumentar o som e pular, nada de análises muito frias e intelectuais. No momento da escola, após um desfile arrastado e sonolento que merecia o rebaixamento, nada melhor que levantar poeira. Foi a melhor escolha da safra, que não era lá grande coisa. Pode até não tirar 30 pontos dos jurados, mas renderá bons momentos para a escola de Padre Miguel. Estou na torcida por isso. David tem uma interpretação correta no CD, embora inferior a do Andanças que defendeu o samba nas eliminatórias. Nota do Samba: 8,8 (Chico da Portela).  

12 - União da Ilha - "A União Voltou". Esse é o clima da escola mais querida do carnaval. Após contratar a grande carnavalesca Rosa Magalhães e trazer um enredo de muita categoria, a Ilha aposta em uma fusão de sambas bastante diferentes. Um melodioso e que corresponde a 80% da obra e o refrão central do outro, de mais empolgação. O resultado final é até interessante, não compartilho da crítica de alguns de que a mudança ficou muito brusca melodicamente da virada da primeira parte para o refrão central. Pode melhorar, pode encaixar um pouquinho mais, contudo do jeito que está não compromete o resultado final. O defeito na minha opinião se dá mais quanto a letra, que vem sendo contada de maneira mais poética e quebra para uma linguagem mais coloquial. Ela é descritiva, narra bem a história de Dom Quixote, embora não tenha nenhuma sacada genial. O Refrão principal tem uma melodia parecida com a de outros sambas, não fugindo da pasteurização atual. Eu, pelo menos, fiquei com um gosto de que poderia ser melhor a faixa da Ilha, principalmente com esse belo enredo. O samba, de qualquer forma, é superior a várias escolas que estão no especial, se o samba fosse essencial no julgamento atual, a Ilha não cairia. Torço exatamente para isso, que ela fique muitos anos no especial que é seu lugar de direito. O Ito tem uma ótima atuação no CD, seu estilo combina perfeitamente com o samba. Nota do Samba: 8,7 (Chico da Portela).