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Coluna do Rixxa Jr.

JÁ NÃO OUVI ESSE SAMBA?

27 de janeiro de 2011, nº 27, ano VII

O Top 10 Sambario retorna para listar dez sambas enredos cujas melodias lembram as de outros sambas que já passaram pela Marquês de Sapucaí 

Todo mundo se deu conta das semelhanças de melodia do refrão do meio samba da Grande Rio de 2011 (Caldeirão vai ferver / A Grande Rio chegou / Vem trazer pra você / Uma porção de amor / É a receita que a bruxinha ensinou) com um refrão do samba da Vila Isabel de 1997 (Hoje a festa do povo / faz a gente sambar / vendo blocos e corsos / como é bom recordar). Plágio ou coincidência musical? 

Plágio é uma denúncia muito séria, pois, na definição do Dicionário Houaiss, é o ato de assinar ou apresentar uma obra intelectual de qualquer natureza (texto, música, obra pictórica, fotografia, obra audiovisual, etc.) contendo partes de uma obra que pertença a outra pessoa sem colocar os créditos para o autor original. Ou seja, o plagiador apropria-se indevidamente da obra intelectual de outra pessoa, assumindo a autoria da mesma. No caso da música, um plágio é caracterizado, tecnicamente, quando aparecem quatro compassos idênticos a uma outra música já existente. 

No entanto, na escala musical adotada no ocidente, que é composta por sete notas – que nem sempre casam entre si –, a chance de cair numa progressão de acordes iguais a alguma existente é grande. Ainda mais que há melodias e ritmos que ficam grudadas no nosso inconsciente, o que faz que um compositor produza uma obra parecida com outra, mesmo que de forma não-intencional. 

O Top 10 Sambario constatou uma semelhança musical considerável em refrões ou estrofes de sambas enredo que já passaram pela Marquês de Sapucaí. Para isso, utilizei alguns critérios de exclusão: não foram incluídos sambas de um mesmo compositor (os autores, em tese, têm liberdade para se auto-plagiarem) e não comparei sambas da mesma entidade carnavalesca. Também não foram considerados sambas cujos compositores recorreram a cantigas populares, músicas de domínio público ou músicas incidentais para confeccionarem o refrão ou parte do samba. Martinho da Vila faz isso com maestria. Juntamente com Gemeu utilizou a cantiga infantil Ciranda, cirandinha no samba “Carnaval de ilusões” (Vila Isabel 1967) e a folclórica Prenda minha em “Glórias gaúchas” (Vila 1970). Os mangueirenses Padeirinho, Nilton Russo e Moacir se inspiraram nos clarins da introdução da marchinha Cidade Maravilhosa para compor o refrão do samba “Rio, um carnaval dos carnavais”, que a verde e rosa apresentou em 1972. 

Acompanhe a listagem e boa diversão! 

10º lugar: “Praça Onze, carioca da gema” (Salgueiro 1970) x “Ai, que saudade que eu tenho” (Vila Isabel 1977). A coincidência aparece aqui nos dois refrões principais. O “abre a roda meninada” apareceu pela primeira vez no samba do Salgueiro que homenageava a Praça Onze. Sete anos mais tarde, ao apresentar um Rio nostálgico, o “abre a roda meninada” reaparece, justamente na parte do samba que relembrava a referida praça.

Oi, abre a roda, meninada
Que o samba virou batucada
Pau pau-pereira
Pau-pereira ingratidão
Todo pau o vento leva
Só o pau-pereira não
(Duduca, Miro, Omildo Souza Bastos e Silvio)

Abre a roda meninada
Que o samba virou batucada
Abre a roda meninada
Que o samba virou batucada
(Dida, Gemeu, Rodolpho)

9º lugar: “Quando o samba era samba” (Portela 1994) x “As águas de Oxalá” (Boi da Ilha 2005). A Portela apresentou um dos melhores sambas da safra de 1994. A cabeça do samba era fortíssima: África, encanto e magia... Onze anos depois, com um enredo afro, o Boi da Ilha apresenta um samba cuja cabeça lembra bastante o samba portelense.

África encanto e magia
Berço da sabedoria
Razão do meu cantar
(Cláudio Russo, Wilson Cruz e Zé Luiz)
 

África é lenda, é poesia
E inspira o Boi da Ilha
A cantar
(Ginho, Ivan Pagodeiro, Nelsinho e Professor)
 

8º lugar: “Xuxa e seu reino encantado no carnaval da imaginação” (Caprichosos 2004) x “João e Marias” (Imperatriz 2008). O samba em homenagem à apresentadora Xuxa Meneghel até hoje é controverso e alvo de críticas por muitos “entendidos”. A escola de samba mirim Inocentes da Caprichosos vai reedita-lo em 2011. O refrão do samba da Rainha de Ramos – vencedor do Estandarte de Ouro em 2008 – tem o primeiro verso que lembra bastante o refrão do samba de Pilares. Curiosidade: Preto Jóia, um dos autores do samba da Xuxa, cantou na avenida o samba da Imperatriz.

Batam palmas ela já chegou...
(Nei Negrone, Preto Jóia, Riquinho Gremião e Silvio Araújo)
 

Vem brincar nesse trem, amor...
(Carlos Kind, Di Andrade, Jorge Arthur, Josimar e Valtencir)

7º lugar: “Uma festa brasileira” (Império Serrano 1994) x “A viagem da pintada encantada” (União da Ilha 1996). A semelhança melódica, em ambos os casos, está no primeiro verso da estrofe que sucede o refrão do meio.

A cultura...
(Beto Pernada, Lula e Zito)

Na cultura...
(Alberto Varejão e Vicentinho)

6º lugar: “A ressurreição das coroas – Reisado, reino e reinado” (Portela 1983) x “Alô, Alô, se liga... tem boi na linha!” (Boi da Ilha 2007). Mais um caso de semelhança melódica na cabeça dos sambas. Será que os compositores do Boi da Ilha se inspiraram no clássico portelense de 1983?  

Vou me embalar na poesia
Do amor e sedução
Extravasando de alegria
O meu coração
(Hilton Veneno e Mazinho da Piedade)

Vou te ligar a poesia
Sou a comunicação
Na pré-história não havia
Telefonia, gritar foi solução
(Aloisio Villar, Barbieri, Cadinho da Ilha, Marquinhus do Banjo e Walkir)

5º lugar: “Templo Negro, em tempo de consciência negra” (Salgueiro 1989) x “Boca do Inferno” (Santa Cruz 1991). O Salgueiro apresentou um dos mais belos sambas da safra 1989. Com a homenagem ao poeta baiano Gregório de Mattos, a Santa Cruz também brindou o carnaval com uma excelente obra, que inclusive ganhou o Estandarte de Ouro. Mas os dois sambas guardam semelhanças nos trechos destacados.

E na atual sociedade
Lutamos pela igualdade
Sem preconceitos sociais
(Alaor Macedo, Arizão, Demá Chagas, Helinho do Salgueiro e Rubinho do Afro)

Surgiu no seio da sociedade
Lutando pela igualdade
Contra o preconceito social
(Carlos Henry, Doda, Giovanni, Luiz Sérgio, Mocinho e Tião da Roça)

4º lugar: “Alimentar o corpo e a alma faz bem” (Grande Rio 2005) x “Jacarepaguá, fábrica de sonhos” (Renascer 2007). Apesar de terem sido gravados em tonalidades diferentes, os dois refrões guardam evidentes semelhanças.

A mensagem de paz, Grande Rio nos traz
A verdade da vida, o prazer de viver
Alimentar o corpo e a alma faz bem

Meu bem querer!
(Barberinho, Competência, Bittar, Marcelinho Santos, Levi Dutra, Licinho Jr., Deré, Mingal, Leleco e Ciro)

Olha a onda, olha a onda... Eu tô na gandaia
Olha a barra da saia, baiana a girar
Em qualquer choupana, alegria emana

Jacarepaguá”
(Cláudio Russo, Carlinhos Detran, Marquinhos, Flavinho do Cavaco, André Malheiros e Julinho Cá)

3º lugar: “O mundo mágico dos Trapalhões” (Cabuçu 1988) x “Uni-duni-tê, a Beija-flor escolheu: é você” (Beija-Flor 1993). Gavião, Magalha e Magnata foram autores de diversos de sucesso no período do auge da geração pagode Fundo de Quintal, com sambas gravados por Jovelina Pérola Negra, Almir Guineto, Zeca Pagodinho, Marquinhos Satã, Só Preto Sem Preconceito, entre outros. Em 1993, a Beija Flor recorreu a uma obra de três sambistas veteranos, entre eles, Edeor de Paula, autor do clássico “Os Sertões”, da Em Cima da Hora (1976). No entanto, há um trecho que é muito parecido com o samba dos Trapalhões. Por coincidência, esses versos também estão no fim da primeira parte, antes do refrão central, assim como o da Cabuçu.

Desperte em você essa lembrança
Vem comigo ser criança
Na carona da ilusão
(Adilson Gavião, Adalto Magalha e Sergio Magnata)

Liberte do seu peito essa criança
Dê as mãos na contradança
Vamos juntos cirandar
(Edeor de Paula, Sérgio Fonseca e Wilson Bombeiro)

2º lugar: “G.R.E.S. Saudade” (Ponte 1987) x “Antes, durante e depois, o despertar do homem” (Grande Rio 1991). Bom, não há como relevar a total semelhança de melodia e o uso de praticamente as mesmas palavras-chave (baiana, sol, lua, continua) presentes nos dois sambas.

No gingado da baiana
Dança o Sol e dança a Lua
Também dança a velha guarda
E a vida continua
(Silvio da Ponte e Zoinho da Ponte)

Gira baiana
Gira o Sol e gira a Lua
Gira o girar do tempo

E a Grande Rio continua
(Andrade, Leovenir e Ventura)

1º lugar: “Macunaíma, herói de nossa gente” (Portela 1975) x “Poemas de máscaras e sonhos” (União da Ilha 1976). A melodia forte do refrão da Portela ainda hoje é marcante. E por mais que os insulanos não queiram, mas a melodia do refrão principal do samba da Ilha de 1976 (aliás, um samba de qualidade e melodia envolvente) é “a cara” de Macunaíma.

Vou me embora, vou me embora
Eu aqui volto mais não
Vou morar no infinito
E virar constelação”
(David Corrêa e Norival Reis)

Crava, crava, crava as garras
No meu peito em dor

Diz o poeta no seu desamor
(Barbicha, Dito, Mestrinho, Waldyr da Vala e Wilson Jangada)

Outras curiosidades:

  • O refrão Ô abra a roda meninada também foi citado no samba derrotado de autoria de Martinho da Vila para o carnaval de 1977. Talvez fosse uma exigência do carnavalesco Arlindo Rodrigues aos compositores para que constassem esses versos nos sambas em disputa. Em 1970, o autor do enredo do Sal foi Fernando Pamplona, que era auxiliado por Arlindo. Em 1977, Rodrigues assinou, sozinho, o enredo da Vila. Isso talvez explique a insistência no refrão.
  • Em “Sonhos de Natal”, João Nogueira e Paulo César Pinheiro tiveram que creditar como “música incidental” o samba “O homem de um braço só”, cujos versos foram inclusos no hino da Tradição de 1987. O interessante é que a música, composta ainda nos anos 70 em homenagem a Natal logo após o falecimento do dirigente portelense, é de autoria da própria dupla.
  • Nogueira e Pinheiro incluíram em “Rio, samba, amor e tradição”, versos do partido alto “Quem samba fica”, de Jamelão e Tião Motorista (Ê, ê, o mar, ê ê o mar / Ê ê o mar, ê ê o mar).
  • Os compositores de samba enredo sempre recorreram a trechos de pontos de umbanda ou candomblé para ilustrarem suas obras. O samba do Salgueiro de 1989, mencionado nesta lista, traz no refrão do meio, um ponto a Xangô – orixá padroeiro da escola – adaptado ao carnaval (Ô Zaziê, ô Zaziá / Ô Zaziê, Maiongolê, Marangolá / Ô Zaziê, ô Zaziá / Salgueiro é Maiongolê, Marangolá). Já os sambistas Aroldo Melodia e Leôncio, recorreram a um ponto de Iansã para fazer o refrão de “Lendas e festas das iabás” (Oiá Oiá Oiá eu / Oiá matamba / De cacurucaia zinguê), que a União da Ilha do Governador desfilou em 1974.
  • Em 1987, Mazinho e Gilson Dr adaptaram a música “Luzes da ribalta”, versão de Braguinha para “Limelight”, de Charles Chaplin, para o refrão do samba da Beija-flor (Para que chorar o que passou / lamentar perdidas ilusões).
  • Martinho da Vila é mestre em adaptar cantigas populares e transformá-las em samba enredo. Além da Ciranda, cirandinha, de 1967, Martinho também incluiu, em 1972, versos da música “Cirandeiro” (Edu Lobo e Capinam) para o samba de 1972 (Ó cirandeiro, ó cirandeiro, ó. A pedra do teu anel. Brilha mais do que o sol).
  • A melodia do refrão central do samba “Voilá”, da Grande Rio 2009 (A força de um povo que revoltado... Se uniu / cruzou fronteiras movimentando meu Brasil / vem o anseio de alcançar liberdade / Meu lema é egalité, fraternidade) guarda uma certa semelhança com a do refrão do samba da Leandro de Itaquera de 2006 (Vou navegar por esse rio de fantasias / desfilar na Passaragua que esplendor / nesse tom vermelho e branco / me leva, me leva nesse barco de amor).
  • Outro caso de melodias parecidas constatei entre os sambas do Salgueiro 2003 e da Inocentes da Baixada 2004. O samba do Sal (de Leonel, Luizinho Professor, Serginho 20, Sidney Sã, Claudinho e Quinho) cujo refrão do meio dizia: Salgueiro, vermelho / Balança o coração da gente.., homenageava aos 50 anos da escola. Já a Inocentes (hoje de Belford Roxo), homenageava o Rio de Janeiro e na primeira estrofe vinha Danado, sarado / irreverente, hospitaleiro..., com uma melodia que lembrava bastante o refrão do Sal.