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Coluna Samba Paulistano
 
6 de dezembro de 2017, nº 29, ano VIII
UMA REFLEXÃO SOBRE O LEMA PAULISTANO PARA O CARNAVAL 2018

“Rumo ao maior Carnaval do país”: slogan ousado causa discussões entre sambistas do Rio e de São Paulo. Até que ponto os paulistas estão certos?.

Foto: Leonardo Rodrigues Dahi

“Rumo ao maior Carnaval do Brasil” era a máxima que todas as cerca de 10 mil pessoas que estiveram na Fábrica do Samba no último sábado encontravam de cara em sua chegada. Frase forte, ousada e reflexiva. São Paulo tem capacidade de ser o maior Carnaval do Brasil? Diria que sim e que não. Para tentar explicar os motivos que levaram a Liga/SP a idealizar tal meta, é necessário fazer uma pequena retrospectiva histórica dos últimos anos.

A crise financeira, política e cultural na terra do Samba
Uma prefeitura quebrada e com um mandatário pouco ligado à questão cultural ameaça o samba no Rio que tem como representante uma instituição fraca e que não sabe o que fazer

No Rio de Janeiro, berço do Samba, a Liga das Escolas de Samba (Liesa) não conseguiu tornar o desfile das escolas de samba auto-sustentável sem que a necessidade dos recursos públicos seja primordial.

Por tudo isso, a chegada de Marcelo Crivella (PRB-RJ) ao cargo de prefeito da cidade deveria ser um sinal de alerta as agremiações cariocas. Infelizmente, não foi.

Ao longo do período eleitoral, promessas vazias e com pouca capacidade de serem cumpridas foram feitas pelo atual prefeito em várias e distintas áreas de atuações (para ficar em um exemplo: Municipalização do Maracanã), porém, o grupo carnavalesco acreditou fielmente na palavra do então candidato e agora prefeito.

Passada a eleição com a vitória do ex-senador e a chegada de 2017, o drama começou. Após os desfiles, que tiveram o constrangimento do fato do prefeito não estar no Rio para entregar a chave simbólica da cidade ao Rei Momo, a realidade bateu à porta das escolas de samba.

Com os trabalhos para a próxima folia momesca começando, o Grupo Especial do Carnaval Carioca foi “surpreendido” pelo corte de 50% da verba municipal. As aspas no surpreendido são necessárias , pois apenas as escolas de samba acharam que isso não ocorreria.

Com a notícia confirmada, ao que parece, muitas escolas foram informadas pela primeira vez (contém grande grau de ironia) da religião do mandatário e de seus planos para a cultura da cidade. A partir deste fato, começaram os muitos casos de “vergonha alheia” proporcionados por integrantes das agremiações.

Além das paupérrimas teorias da conspiração, acredito que ser obrigado a recorrer ao Deputado Pedro Paulo (PMDB-RJ), acusado de agredir a ex-esposa, para conseguir uns “trocados” junto ao atual presidente da república que conta com incríveis 3% de aprovação, foi o fundo do poço que a Liesa poderia chegar em termos de imagem.

Além das notícias desesperadoras em termos financeiros e de imagem, a Liesa também conseguiu se superar na falta de inteligência. O cancelamento dos ensaios técnicos dificulta a relação com o que deveria ser o maior aliado da Liga nessa batalha: o povo.

Sem os ensaios técnicos (gratuitos até 2017), boa parte do público que gosta e acompanha carnaval ao longo dos 365 dias, perdeu a chance de ver sua escola na Sapucaí. Para mim, claramente, um tiro no pé.

Por conta disso, sem citar a total falta de construção de alguma ação de marketing ou na capacidade de arrecadar dinheiro com qualquer tipo de ação/produto referente às escolas de samba, acho que três fatores resumem a situação atual: acomodação, incapacidade administrativa e falta de inteligência. Um nicho, como é o carnaval, não permite que erros nesse nível sejam perdoados.
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Foto: Jornal do Brasil

Com iniciativas básicas, São Paulo se torna referência de modernidade no Carnaval
Sem fazer grandes inovações ou medidas de impacto, gestão da Liga paulistana se coloca como sopro de modernidade e de exemplo pro futuro.

Em contra-partida, na Terra da Garoa, nos últimos anos, a gestão da Liga/SP tenta a passos de tartaruga mudar a situação de dependência entre Carnaval e poder público.

Apesar de aguentar quatro anos de uma gestão (Fernando Haddad — PT) que pouco ligou para o Carnaval do Anhembi sem fazer muito esforço para mudar as coisas, Serginho e sua trupe avançaram nesse período na questão de marketing/patrocínio, venda de ingressos online e na arrecadação de dinheiro em algumas frentes que ultrapassam a barreira dos desfiles.

O grande exemplo desse último item é a festa do CD, que já virou uma marca registrada na Folia Paulistana. Há duas edições o evento é realizado na ainda inacabada Fábrica do Samba I. Com ingressos populares (R$20) e que dão direito a um exemplar do disco, a Liga vem conseguindo atrair cada vez mais público para o evento, chegando ao belíssimo número de 10 mil presentes na última ocasião.

Além disso, a comunicação via redes sociais — que a Liesa parece desconhecer — é cada vez melhor, construindo uma relação mais próxima entre os fãs de outros estados e o Carnaval da capital paulista. Uma antítese do que ocorre no Rio.

Acima dos feitos de marketing e de relação pública, a Liga/SP conseguiu, em 2015, um feito grandioso. Com seus próprios recursos, a instituição restaurou um galpão próximo ao Anhembi com capacidade de receber as escolas do Grupo de Acesso I e II. O local conhecido com Fábrica do Samba II foi reformado e hoje já abriga as escolas do Acesso I. Se a Liga não fez muito pela Fábrica do Samba I nos últimos 4 anos, a construção da Fábrica do Samba II foi um golaço da administração da Liga Paulistana para acabar com o drama de falta de estrutura das escolas dos grupos menores.

A relação com o poder público, que está em níveis terríveis no Rio, nunca foi nenhum desastre em São Paulo, mas melhorou — e muito — na gestão de João Dória (PSDB). Com força empresarial, o atual prefeito, ao lado do patrono da Estrela do Terceiro Milênio, escola do grupo de Acesso II, e presidente da câmara de vereadores, Milton Leite (DEM), conseguiu criar uma parceria muito interessante com a gestão da Liga.

A promessa de conclusão da Fábrica do Samba I em Junho é apenas uma cereja num bolo que a cada dia fica mais saboroso para os amantes da festa paulistana. Por tudo isso, o lema “rumo ao Maior Carnaval do Brasil” pode parecer ousado, mas está longe de ser impossível a médio prazo.

Foto: Blog Visite São Paulo

O lema e seus significados
Frase é ousada e até utópica em certo ponto, mas merece uma discussão profunda entre os sambistas das duas cidades

Falando do lema em si, podemos dividir em dois pontos. A meta real e a meta utópica.

Falando primeiro da meta utópica, não vejo, em momento nenhum, nem a longo prazo, o carnaval paulistano virando a REFERÊNCIA para o público nacional e internacional como o Carnaval do Brasil. Por mais gestão que se tenha, por mais investimento que aconteça, a magia e a imagem do carnaval das Escolas de Samba será do Rio de Janeiro.

Já em relação a meta real, acho plausível sim, começarmos a discutir a possibilidade do carnaval paulistano se tornar o mais “grandioso” do país. Não falo em termos de charme ou de imagem, mas de estrutura de festa e de atrativos para o espectador. Para isso, no entanto, as escolas paulistas precisaram dar um salto em algumas áreas.

O desfile, certamente, irá subir de patamar nos próximos anos por dois fatores: a melhoria da estrutura profissional que deve atingir a questão de plástica (alegorias e fantasias) e o respeito ao sambista, que deve construir comunidades ainda mais unidas e ligadas à folia durante o ano todo.

Apesar disso, para mudar sua cara, o carnaval paulistano PRECISA melhorar o seu calcanhar de Aquiles que é, sobretudo, o quesito enredo. Temas bobos e sem profundidade cultural ou histórica ainda são vistos em muitos desfiles do sambódromo do Anhembi e atrapalham a composição de sambas marcantes. Para o carnaval de São Paulo se tornar ainda mais atrativo é NECESSÁRIO mudar isso.

Além desse ponto do desfile, vejo que a postura fechada e até certo ponto, intransigente das escolas com pessoas “de fora” do carnaval como uma barreira para um boom maior de público na cidade. Também vejo a pouca atuação de algumas escolas em redes sociais como um problema a ser contornado – apesar de ver uma ligeira mudança nisso no último ano.

Em que pese os problemas a ser contornados, acredito sim na capacidade do carnaval paulistano em se tornar, não o maior, e sim, o mais atrativo do país. A estrutura dá sinais de evolução, os sambistas são cada dia mais respeitados e o público, cada dia maior. Além disso, vejo que a visão da folia do Anhembi no público carioca mudou. Se em anos passados, as comparações jocosas com a Série A (Grupo de Acesso do Rio) eram comuns, ao longo dos últimos dois anos, é comum ver elogios aos desfiles do Anhembi vindos do Rio. Pra mim, isso já é um feito enorme da gestão da Liga e das escolas de São Paulo e diz muito sobre o momento da folia do Anhembi.

Sendo assim, penso que o lema “Rumo ao maior Carnaval do Brasil” pode até parecer arrogante, sem sentido ou até cômico para muitos, mas faz todo sentido pensando na valorização interna de uma festa que só cresce.