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Coluna do Marcelo Guireli

O DESFILE DE 1992

Os diretores da LIESA estavam muito felizes após o desfile de 91. Com a queda de quatro escolas para o Grupo 1 e o acesso de apenas duas para o Especial, o desfile organizado pela Liga teria, enfim, quatorze escolas, possibilitando que todas as agremiações desfilassem sob as luzes artificiais do Sambódromo, o que era do agrado de muitos dirigentes, pois sempre houve o mito de que desfilar de manhã não é bom, do que eu discordo totalmente, haja vista momentos gloriosos do Carnaval Carioca protagonizados por sambistas envoltos em fantasias iluminadas pela luz do astro rei. Aliás, observando todos os desfiles realizados na Marquês de Sapucaí anteriores ao de 1992, verificaremos que o maior número de títulos foi conquistado por escolas que desfilaram durante o dia.

Com sete escolas desfilando no domingo e mais sete na segunda o desfile teria início às 19h, mas, como se sabe, a Acadêmicos de Santa Cruz, que fora prejudicada no ano anterior no desfile do Grupo 1, entrou como uma ação na Justiça reivindicando seu direito de participação no desfile principal e acabou conseguindo, às vésperas do carnaval, uma vaga para abrir o espetáculo.

Com a presença da Santa Cruz confirmada, o regulamento determinou que as três últimas colocadas fossem rebaixadas para o Grupo 1 e o desfile de domingo teve início mais cedo, no inusitado horário das 17h40, com um sol tímido começando a se pôr atrás dos contornos da cidade.


Conjunto visual da Santa Cruz

ACADÊMICOS DE SANTA CRUZ – Com o enredo “De Quatro em Quatro eu Chego Lá”, dos carnavalescos Albeci Pereira e Ney Ayan (que faleceu bem antes do carnaval), a agremiação da Zona Oeste abriu o desfile das grandes escolas com as arquibancadas ainda bem longe de estarem lotadas. Aliás, muita gente pensava que o desfile ia ter início às 19h. Depois de todos os trâmites judiciais que a Santa Cruz enfrentara, a escola ainda teria que lidar com inúmeros problemas que aconteceriam durante a sua apresentação. O segundo carro, que simbolizava os quatro elementos da natureza, quebrou na entrada da pista e, por conta disso, a comissão de frente (Seres Celestiais) e o abre-alas (A Descoberta do Planeta) só começaram a evoluir significativamente quando os cronômetros já apontavam quase 20 minutos de desfile. Apesar do contratempo inicial a escola parecia estar preparada para um bom desfile, haja vista a beleza das primeiras alas, que representavam a água, o fogo, a terra e o ar. As fantasias, em geral, apelavam para o luxo e estavam de bom efeito, principalmente devido aos ricos bordados em paetês e, também, ao mar de plumas em várias nuances de verde, o que dava uma unidade visual muito boa. Gostei do carro que salientava os quatro lados da pirâmide e, mais ainda, do enorme Carro do Cassino, que era precedido por uma bela ala com representação dos naipes do baralho. As duzentas baianas abriram o setor referente às estações do ano; estavam lindas, com aplicações de flores ao lado do torço, que era encimado por plumas em dois tons de verde. Uma bela ala, com flores multicoloridas, apresentou-se a seguir, preparando os caminhos para a evolução do primeiro casal de mestre-sala e porta-bandeira: os experientes Élcio PV e Dóris. Ao lado deles, como rainha da bateria, surgiu uma tímida Vera Benévolo, numa pequena traição à Mocidade Independente. A bateria imprimiu uma cadência muito gostosa ao samba puxado com competência pelo Sobrinho. Aliás, vale a pena destacar o bom gosto da indumentária dos ritmistas, que estavam vestidos como os “Reis do Baralho”. O problema é que, como a escola estava atrasada, os diretores optaram por não colocar a bateria no boxe e, a partir daí, os componentes da Santa Cruz começaram a correr em demasia e enormes claros surgiram na pista. Os dois belos carros com dupla mensagem, que representavam as quatro estações do ano, passaram rapidamente pelo centro da Sapucaí e tudo se perdeu de vez com a quebra do Carro do Bar. Outra coisa que me causou estranheza é que a escola não tinha muitos componentes separando as alegorias nesses últimos setores. Tive a nítida impressão que muitos componentes não conseguiram chegar a tempo para o desfile. Para agravar a situação, a empresa responsável pela retirada dos destaques não conseguia fazer o serviço com rapidez e o resultado foi um congestionamento de alegorias na Praça da Apoteose, o que acabou prejudicando também a saída dos componentes. Infelizmente, com todos esses percalços, a escola acabou realizando um desfile sofrível.


Detalhes do abre-alas da Leão de Nova Iguaçu

LEÃO DE NOVA IGUAÇU – Aguardada com ansiedade, graças ao seu enredo em homenagem a Janete Clair, a Leão de Nova Iguaçu iniciou sua apresentação com alguma hesitação, pois só passou a evoluir com fluidez quando os cronômetros já apontavam 10 minutos de desfile. Os carnavalescos Fábio Borges, Adalmir Braga e Paulo Sottero foram os responsáveis pelo enredo: “O Leão na Selva de Ilusões de Janete Clair”. O samba, embora não fosse uma obra-prima, tinha bons momentos melódicos e uma letra pertinente ao tema. A bonita comissão de frente fez uma referência à música “Clair de Lune”, que teria inspirado o nome da novelista. Atrás, o primeiro carro, denominado Selva de Ilusões, abriu passagem para os mais de 3.500 componentes da escola. Eu gostei bastante do carro Usina de Emoções, que trouxe Denise Emmer, filha de Janete, como destaque. A alegoria tinha engrenagens decoradas com corações e chaminés douradas que soltavam fumaça branca, o que reforçava o clima de sonho que os carnavalescos queriam passar. A bateria apresentou-se no setor dedicado à novela Selva de Pedra e vestiu-se com criatividade, embora o resultado plástico não tenha sido dos mais exuberantes. À frente dos ritmistas, o casal de mestre-sala e porta-bandeira apresentou-se com belas fantasias, mas com algumas dificuldades para driblar o vento, que, a partir da apresentação da Leão, começou a atrapalhar a vida dos sambistas, principalmente dos destaques. Apesar de bons momentos de criatividade e de clara demonstração de bom gosto, eu percebi alguma irregularidade na concepção de figurinos e alegorias. Gostei bastante da divisão cromática feita pelos carnavalescos, inclusive porque, em vários momentos, percebia-se a preocupação de respeitar as cores da escola, que, para quem não se lembra, são: o ouro, o vermelho e o branco. Achei de extrema beleza o figurino das baianas, já no final do desfile. Vestidas de vermelho, amarelo, laranja e preto, elas rodopiaram suas saias com vigor e conseguiram causar um impacto favorável. O enredo, como um todo, foi bem apresentado, mas uma famigerada ala de artistas, em frente à bateria, acabou quebrando a harmonia da escola e prejudicando um pouco o desfile, que, no geral, foi bem simpático.


A Mangueira desfilou com destaques bem fantasiados. No detalhe, o Carro da Bossa Nova

ESTAÇÃO PRIMEIRA DE MANGUEIRA – Primeira das grandes escolas a entrar na pista, a Mangueira iniciou sua apresentação de uma forma totalmente diferente das duas agremiações anteriores. Assim que os portões foram abertos os quase 5.000 componentes, divididos em 30 alas, começaram suas evoluções rumo à Praça da Apoteose. Cantando o enredo: “Se Todos Fossem Iguais a Você”, homenagem a Tom Jobim, a escola pisou forte na Sapucaí e conquistou o público logo de cara. O carnavalesco Ilvamar Magalhães organizou as alas e os carros com bastante coerência e soube jogar muito bem com as cores da escola, o que não é tarefa das mais fáceis. Mordida com as colocações ruins dos anos anteriores a Mangueira foi buscar seu velho diretor de harmonia: o lendário Xangô. O fato é que a escola fez uma apresentação empolgante, com as alas integradas, evoluindo de forma ágil e sem abrir buracos. A comissão de frente apresentou-se com elementos decorativos representando a música. Seus componentes estavam alinhados, mas não apresentaram a escola de forma muito convincente. Atrás do abre-alas, três bonitas alas, com representação do sol, do mar e da montanha, abriram passagem para a alegoria denominada “Sinfonia do Rio”, que fechou este primeiro setor. O terceiro carro, um dos maiores da escola, foi o dedicado à Bossa Nova, com destaque para o eterno parceiro de Tom: Vinícius de Moraes. Eu gostei bastante do Carro das Musas, que tinha enormes esculturas num tom de rosa muito delicado e era todo ornamentado em espelhos. A bateria, com fantasias referentes à música “Passarinho”, manteve uma ótima cadência, o que valorizou o samba, que não era dos melhores, mas tinha um apelo popular muito grande. No carro Tom e a Natureza destacou-se o próprio homenageado, ao lado de seu piano e cercado por composições vestidas de borboletas. As baianas vestiram-se de prata, com pequenos detalhes feitos em verde e rosa. Estavam bonitas e representavam a música “Chovendo na Roseira”, que também foi motivo de inspiração para um dos carros, o que apresentou Marlene Arruda como destaque principal. A última alegoria, com nome igual ao título do enredo, foi encimada por fantasias de rara beleza e de extremo luxo. O único senão do desfile ficou por conta de uma ala, denominada “Amigos de Tom”, que quebrou um pouco o belo conjunto visual, pois apresentou alguns integrantes completamente descompostos. Isso, porém, não foi tão grave, pois os êxitos da escola acabaram encobrindo os pequenos problemas.


Visão geral do desfile da Imperatriz

IMPERATRIZ LEOPOLDINENSE – Debaixo de uma chuva fina e contando com cerca de 3.000 componentes, a escola de Ramos abriu seu esperado desfile disposta a brigar pelos primeiros lugares e um dos motivos para tanto otimismo era a presença da talentosa carnavalesca Rosa Magalhães, responsável pelo enredo “Não Existe Pecado Abaixo do Equador”. Para celebrar os 500 anos da descoberta oficial da América, a carnavalesca resolveu “carnavalizar” o tema e os aspectos históricos foram apresentados com muita estilização e elementos fantasiosos. A comissão de frente, pela primeira vez sob o comando do coreógrafo Fábio de Mello, trajou-se de forma impecável para fazer alusão aos navegadores. Adorei! Antes do carro abre-alas, mais uma vez composto pela coroa, símbolo da agremiação, foi apresentada uma alegoria referente à flora e fauna exuberantes da América. O setor dedicado ao mar foi um dos mais comentados e elogiados após o desfile, graças a uma belíssima ala de baianas e, principalmente, a ala do barracão, que veio coberta por uma malha que, conforme os movimentos dos sambistas, imitava com criatividade as ondas do mar. Os detalhes das alegorias eram de encher os olhos. No Carro da Onça, por exemplo, havia dois estandartes com bordados exuberantes, que valiam pela alegoria inteira. A bateria desfilou com uma caravela na cabeça e teve seu ponto forte, como sempre, no naipe de tamborins. O samba, apesar de alegre, era fraco e talvez por isso não tenha havido uma grande animação por parte do público, que nem de longe se empolgou como na passagem da Mangueira. Apesar disso, os componentes evoluíram bem, sem abrir buracos, e a escola fez uma passagem das mais corretas, impressionando pela extrema criatividade de seu carnaval. Encerrou seu bonito desfile com o carro Dádivas do Paraíso, que era composto por muitas flores, frutos e borboletas.


Destaques de luxo nas alegorias da Caprichosos

CAPRICHOSOS DE PILARES – “Brasil Feito à Mão... Do Barro ao Carnaval”, do carnavalesco Alexandre Louzada, foi o enredo que a escola levou para a Sapucaí no carnaval de 92. Foi uma bela idéia para homenagear os artesãos brasileiros, através de suas obras feitas com o barro, a madeira, a lata, a palha e tantos outros materiais tão simples. Os mais de 4.000 componentes, dispostos em 35 alas, iniciaram o desfile de forma organizada, mas um problema de última hora atrapalhou a escola. Um diretor não entregou as fantasias de uma ala a tempo e vários componentes, que certamente não tinham nenhum amor pela escola, entraram na pista completamente descompostos, prejudicando de forma considerável os quesitos Fantasia e Conjunto. Aliás, as fantasias da escola estavam bonitas, mas eram muito repetitivas, pois quase todas as alas se apresentaram com enormes esplendores, não havendo uma variação de formas, o que seria necessário para se passar o enredo de forma clara e criativa. Gostei muito do abre-alas, que fez referência à cerâmica Marajoara. O Carro da Madeira, com as carrancas do São Francisco e muitas figuras de santos, estava também muito bonito. Aliás, de uma forma geral, as alegorias do Alexandre estavam muito bem acabadas e encimadas por destaques de primeiríssimo nível. No Setor do Metal, com muitas citações ao Candomblé, a beleza maior ficou por conta das baianas, vestidas de Oxum. Os ritmistas, além de uma boa exibição, chamavam a atenção pela beleza da indumentária, referente ao próprio carnaval. O único “pecado” da bateria, a meu ver, foi ter tocado afoxé no momento do refrão, o que, para o meu gosto, não foi uma grande idéia. Aliás, o samba, que era mediano, foi bem cantado no dia do desfile, com uma bela atuação do saudoso Carlinhos de Pilares. A Caprichosos fez uma boa apresentação, mas seu enredo, lamentavelmente, não foi desenvolvido como poderia e, além disso, os problemas já citados, aliados ao buraco causado pela quebra do carro em homenagem às rendeiras, prejudicaram consideravelmente o desfile, que foi encerrado com belas alas em nuances de azul, representando os artistas do carnaval.


Xangô do Salgueiro no alto do carro e o belo conjunto vermelho e branco

ACADÊMICOS DO SALGUEIRO – Os 5.000 componentes já estavam prontíssimos na armação enquanto os últimos caminhões da COMLURB iam deixando a pista, após uma rápida limpeza. Havia 17 anos que a escola não ganhava um campeonato e este era o único objetivo de todos os Salgueirenses. “O Negro Que Virou Ouro nas Terras do Salgueiro” foi o enredo criado pelo carnavalesco Flávio Tavares, que acabou se afastando da escola meses antes do desfile, dando lugar ao decorador e artista plástico Mário Borriello, que manteve todos os figurinos propostos pelo Flávio. O projeto dos carros, no entanto, foi feito pelo Mário, que optou por uma linguagem bem simples e de bom humor para passar os capítulos do enredo, que, na verdade, nada mais era do que a história do café. Uma comissão de frente muito bem vestida, com movimentos ágeis que representavam o café sendo pilado, chamou a atenção do público. Em seguida vinha o abre-alas, com a figura do preto-velho socando seu pilão. A escultura estava muito bem feita, mas o carro estava longe de causar algum impacto, talvez por apresentar composições muito simplórias. Aliás, os destaques de composição do Salgueiro nunca estiveram tão mal vestidos e prejudicaram bastante a exuberância natural das alegorias. Outro problema foi que os diretores resolveram colocar cintos de segurança em quase todos os destaques e isso passou a impressão de falta de acabamento, haja vista que o cinto era um elemento completamente estranho às fantasias. O carro que eu mais gostei foi o que representou a Arábia, mas, de uma forma geral, achei as alegorias, apesar do bom humor das esculturas, bem aquém da tradição da escola. Gostei bem mais das fantasias, que estavam bem desenhadas e dimensionadas, embora algumas alas também não apresentassem um acabamento dos melhores. De qualquer forma é sempre bom ver o Salgueiro vestido com suas cores, principalmente quando o vermelho e o branco também são usados para colorir as saias das baianas, que tinham no pano da costa um tecido imitando o saco de café e sementes nas peneiras que decoravam seus chapéus. As velhas senhoras se apresentaram com a maior dignidade, como, aliás, a maioria dos componentes. O Salgueiro fez um desfile ágil e alegre, impulsionado por uma excelente bateria, mas, a meu ver, ficou devendo muito na parte visual. O desfile terminou com a passagem do carro: “Gostoso Como Um Beijo de Amor”.


A Viradouro e seu gigantesco carro do Egito

UNIDOS DO VIRADOURO – Passava das duas horas da madrugada de segunda-feira quando uma das mais esperadas escolas do ano começou a se movimentar na armação rumo à Apoteose. A Viradouro apresentou o enredo “E a Magia da Sorte Chegou”, de autoria dos carnavalescos Max Lopes e Mauro Quintaes, que contou a história do povo cigano desde suas origens, na Europa Oriental. Além do dinheiro que sabidamente estava sendo investido no barracão e no ateliê, a escola contava, na minha opinião, com o melhor samba do ano, cujos autores eram Gelson, Heraldo Faria e Flavinho Machado. Uma comissão de frente formada por doze homens representando os primeiros ciganos da Era Cristã (Reis Magos) prenunciava a beleza que viria a seguir. Duas carroças, ladeadas por um grupo de 100 ciganos e mais dois quadripés representativos do enredo pediram passagem para as primeiras alas. Só então surgiu o imponente abre-alas, trazendo uma enorme coroa, decorada com moedas douradas, paetês e espelhos. Sobre a coroa, montada em cima de uma estrela e um pandeiro cigano, o destaque ficou por conta de Talita Monassa. Atrás do abre-alas surgiu a primeira ala de baianas, com fantasias ricamente detalhadas em cobre, prata, ouro e laranja. O setor referente à Índia foi um dos mais bonitos de todo o desfile, com uma ala nas cores do arco-íris e uma outra (toda em branco e ouro) representando Shiva, além de dois enormes carros com elefantes. Em seguida foram mostradas alas com penas de pavão que antecediam o monumental Carro do Egito, com destaque para seus deuses, bigas e uma enorme pirâmide. Além da beleza do conjunto, a Viradouro impressionava pelos detalhes, que eram de encher os olhos. A entrada da bateria no boxe foi o primeiro contratempo enfrentado pela escola na pista. Devido a um claro deixado na apresentação do primeiro casal de mestre-sala e porta-bandeira (Andrezinho e Patrícia), que vinha à frente dos ritmistas, os componentes tiveram que apressar o passo. Atrás da bateria vinham lindas alas representativas dos ciganos húngaros. Era um setor todo em branco e prata, que foi fechado pelo Carro da Rússia, realizado com fibra de vidro e algodão, para dar um efeito de neve. A essa altura já estávamos com aproximadamente uma hora de desfile e a Viradouro ainda estava quase toda na pista. No setor referente aos ciganos da Espanha foi apresentado um grande carro alegórico com touros, toureiros, rosas e cartas de baralho. A chuva voltou a marcar presença na Sapucaí no momento em que a segunda ala das baianas, vestida de cartomantes, atingiu o centro da pista. As senhoras estavam vestidas de vermelho, dourado e cobre, com leques de cartas como adereços. Até este momento tudo indicava que a Viradouro disputaria o título e com uma grande dose de favoritismo, já que seu carnaval era muito superior aos das escolas que a antecederam.


Um dos momentos mais dramáticos da história dos desfiles

No entanto, um lamentável acidente chocou o público com a chegada do Carro da Rússia na dispersão. Antes que a alegoria fizesse a curva para deixar a pista de desfiles, chamas, provavelmente provenientes de um curto circuito no gerador, começaram a tomar conta do carro, causando pânico nos destaques e uma correria dos homens do corpo de bombeiros, que, em vão, tentaram apagar o incêndio usando extintores. Silvinho Fernandes, destaque principal do carro, foi um dos primeiros a perceber que a fumaça branca, um dos efeitos especiais idealizados pelos carnavalescos, foi se tornando cinza. Quando notou que as chamas começavam a consumir o carro, ele desceu como pôde e, assim como ele, os outros destaques fizeram. Alguns literalmente se jogaram de alturas consideráveis, mas, felizmente, ninguém morreu, apesar de várias pessoas terem se ferido com alguma gravidade. Em menos de um minuto uma fumaça preta cobriu a Praça da Apoteose, proporcionando uma imagem impressionante e triste. O carro em chamas não permitia que o restante da escola deixasse a Sapucaí com fluidez. A PM e os bombeiros isolaram a alegoria e fizeram uma espécie de corredor humano para que os componentes dispersassem. Só quando a alegoria estava completamente comprometida é que os carros-pipa chegaram a Apoteose. Aliás, eles entraram pela Rua Salvador de Sá e seguiram ladeando as alas e “driblando” as alegorias até a dispersão, mas, infelizmente, já era tarde. A alegoria ficou completamente destruída e seu “esqueleto”, às pressas, foi empurrado até onde foi possível, afinal era preciso que os outros carros dispersassem. Por causa do incêndio a escola ficou com a evolução e a harmonia comprometidas, já que os carros e alas ficaram impedidos de avançar. Foi uma tristeza! A Viradouro terminou sua apresentação com 13 minutos de atraso, apresentando um gigantesco carro em homenagem a Juscelino Kubitschek. Apesar dos momentos dramáticos e de toda a celeuma causada com o incêndio, a Viradouro apresentou um dos desfiles mais ricos e bonitos, em termos de pesquisa e realização, que eu já assisti.


O Carro das Artes foi um dos mais bonitos do desfile da Beija-Flor

BEIJA-FLOR DE NILÓPOLIS – Com um enredo em homenagem à televisão, denominado: “Há um Ponto de Luz na Imensidão”, do carnavalesco Joãozinho Trinta, a Beija-Flor iniciou seu desfile causando um grande impacto, graças ao seu monumental abre-alas, que tinha uma iluminação completamente nova, com canhões de luz que clareavam até os últimos degraus da arquibancada e uma quantidade de luzes internas que faziam arder os olhos. Atrás do carro vinham as baianinhas, seguidas pelas baianas tradicionais, todas de branco. Um carro de concepção estética completamente contrária ao do esplendoroso abre-alas abriu o setor dedicado às novelas, com uma merecida citação à “Escrava Isaura”. Atrás da alegoria seguiam alas dedicadas à primeira novela brasileira. Estavam bonitas, em branco e preto, mas pelo menos uma dessas alas apresentou componentes com fantasias incompletas. É importante observar que a chuva, que começou a cair no final do desfile da Viradouro, continuou durante toda a apresentação da Beija-Flor, mas eu creio que isso não justifique a falta de acabamento de alguns carros e fantasias. No gigantesco carro que representou a novela “Sheik de Agadir” alguns destaques de composição apresentaram falhas em seus figurinos e isso, a meu ver, prejudica a nota de Alegorias. O setor dedicado à novela “Que Rei Sou Eu?” estava alinhado, com fantasias de fácil leitura e de muito bom efeito. O carro que representou a novela também era enorme e foi apresentado em duas faces: na primeira, a pobreza do povo de Avilã e, na segunda, o luxo da corte, com destaque para quatro grandes candelabros que causaram um belo efeito quando vistos de cima. Não gostei muito das alas ecológicas referentes à novela “Pantanal”; estavam bonitas, corretas, mas sem muito impacto, assim como o carro que fechou o setor. Gostei menos ainda do carro Notícias, que tinha uma concepção nada elegante, talvez por causa de suas formas pouco harmoniosas. Também achei de extremo prejuízo para a escola a presença de alas com mocinhas exibicionistas, fazendo coreografias paupérrimas e que nada acrescentavam ao desfile. E o pior é que muitas dessas moçoilas estavam desfilando sem todos os elementos de suas diminutas fantasias. Gostei bastante do carro Humor e Show, que apresentou formas bem interessantes em sua parte traseira, além de uma iluminação muito pertinente. O Carro das Artes, que destacou o Teatro Grego, também causou um bom impacto, assim como o Carro das Ciências e Culturas, que apresentou duas pessoas nuas, fazendo com que a escola fosse “agraciada” com a perda de pontos na apuração, já que desfilar com a genitália desnuda era e continua sendo proibido pelo regulamento da LIESA. A bateria, com chapéus leves e bonitos, acompanhou com competência o fraquíssimo samba da escola. O desfile foi encerrado com alas alusivas ao carnaval e com um grande carro com a mesma temática, que prestou uma merecida homenagem a Chacrinha. Foi um desfile com bons momentos, mas o enredo não foi desenvolvido como poderia e a Beija-Flor acabou realizando o seu pior desfile desde a inauguração do Sambódromo. A escola encerrou sua apresentação pouco depois das 5 da madrugada, sob uma chuva que começava a aumentar.


Um casamento em pleno desfile da Tradição

TRADIÇÃO – A chuva que insistiu em cair durante todo o desfile da Beija-Flor também marcou presença no final da tarde de segunda-feira, prejudicando um pouco a concentração e a armação da Tradição, a primeira das sete agremiações da segunda noite de desfiles. Com o enredo “O Espetáculo Maior... As Flores”, do carnavalesco Jorge Luis Vilela, a escola abriu sua apresentação com uma comissão de frente bem vestida, mas cheia de problemas em suas evoluções, já que o peso dos esplendores tornou-se insustentável com a chuva. As coreografias ficaram tão prejudicadas que os esplendores tiveram que ser retirados antes que a escola atingisse o centro da pista. O enredo passou a ser mostrado a partir do mar, motivo das alas que vieram logo em seguida ao abre-alas que, mais uma vez, apresentou o condor coroado, símbolo da escola, O enredo passeou pelo Egito; visitou as tulipas da Holanda; chegou ao Japão e ofereceu rosas brancas a Iemanjá, mas a Tradição não conseguiu se apresentar tão bem quanto a Acadêmicos da Rocinha, que no desfile do Grupo 1, no sábado, desfilou de forma convincente com um tema muito parecido. Além de desfilar com alguns carros de concepção grosseira, o acabamento de várias alegorias da Tradição era precário e essa situação foi ainda mais agravada pela chuva. Com enormes buracos causados a partir da evolução do casal de mestre-sala e porta-bandeira (Wilma Nascimento e Paulo Roberto), a harmonia da escola acabou sendo um fiasco. Era impressionante o número de pessoas vestidas com a camisa dos diretores que nada faziam para corrigir os erros. Pelo contrário, eles atrapalhavam ainda mais o conjunto. A frase do presidente da escola, ao final do desfile, resume bem o que foi a passagem da Tradição: “Sem dúvida, ACHO que dá para ficar no Grupo Especial”.


Muita simplicidade e adequação ao enredo nos carros da Vila

UNIDOS DE VILA ISABEL – Prejudicada com a quebra de uma de suas principais alegorias, ainda na área de concentração, a Vila abriu seu desfile com uma belíssima comissão de frente, composta por homens trajando fantasias que faziam referência aos três continentes citados no enredo “A Vila Vê o Ovo e Põe às Claras”, do carnavalesco Gil Ricon. O tema, ao contrário do que fizera Rosa Magalhães na noite anterior, questionava de forma contundente e sem meias palavras os 500 anos do Descobrimento da América, que, segundo o enredo, já recebia seus visitantes muito antes da chegada da frota de Colombo. A primeira parte da apresentação de Vila Isabel, que foi “banhada” por um raio laser desde a coroa que abriu seu desfile, foi denominada “Ameráfrica”, com destaque para inúmeras embarcações africanas. A Egípcia não me agradou nem um pouco, haja vista suas proporções exageradas e deselegantes. O carro Mandinga, etnia do oeste africano, estava melhor concebido, mas eu gostei mesmo foi da novidade empregada nas saias das baianas, que estavam feitas com algodão branco desfiado, o que de longe dava um lindo efeito de plumagem, fazendo com que as senhoras parecessem estar flutuando pela pista. O carro Galinha dos Ovos de Ouro, no qual a escola depositava muita confiança, acabou passando sem chamar muita atenção, mas o pertinente enredo da escola foi apresentado com correção, embora as dificuldades financeiras fossem evidentes. Aliás, por conta disso, dizia-se na fase pré-carnavalesca que a Vila era uma das fortes candidatas ao rebaixamento. De fato, acredito que a Vila tenha feito o desfile mais barato entre as quinze agremiações do Grupo Especial, mas a falta de dinheiro foi compensada com muito samba no pé e por uma bateria excelente, que conseguiu dar um balanço ao samba não muito inspirado da escola. Os componentes e diretores chegaram à dispersão certos de terem dado o seu melhor, mas isso, infelizmente, talvez não fosse o suficiente para livrar a escola de uma colocação ruim, ainda mais depois dos terríveis problemas na apresentação do primeiro casal de mestre-sala e porta-bandeira (Carlinhos Brilhante e Mariazinha), que desfilaram com suas fantasias incompletas e despencando. Lamentável!


O belo visual da Estácio de Sá

ESTÁCIO DE SÁ – Depois de dois bons resultados sob o comando do carnavalesco Mário Monteiro e do figurinista Chico Spinoza, a Estácio entrou na pista cercada de boas expectativas. O enredo “Paulicéia Desvairada – 70 Anos de Modernismo no Brasil” prometia causar um bom impacto, o que, de fato, aconteceu. Enquanto a comissão de frente e o abre-alas avançavam lentamente pela pista o público de todos os setores se levantava e começava a entoar com entusiasmo os versos do samba de Djalma Branco, Déo, Maneco e Caruso. Era como se a avenida ganhasse uma aura especial para a passagem da Estácio, tamanha foi a magia daquele momento. Os membros da comissão de frente se apresentaram sobre pernas de pau, trajando-se de arlequins, pierrôs e colombinas, inspirados no livro que deu nome ao enredo, de autoria de Mário de Andrade. O abre-alas, muito bem realizado, representou o Teatro Municipal de São Paulo, palco da semana modernista de fevereiro de 1922. Atrás dele vinham alas vestidas com extrema competência e beleza. O que me agradou logo de cara foi a elegante combinação de cores, que privilegiou o vermelho e o branco tradicionais. No início do desfile foram apresentadas alas e alegorias ilustrativas à fase anterior à Semana de Arte Moderna. O carro A Terra Prometida, que teve o destaque Paulo Varelli como o “Filho da Terra”, apresentou as matas brasileiras. Eu adorei a fantasia da bateria, toda em vermelho e prata, representando os novos bandeirantes. Villa Lobos foi homenageado através de uma ala em branco (de rara leveza) que tinha o nome de “Bachianas” e através de uma grande alegoria alusiva ao “Trem do Caipira”. As baianas vestiram-se de “Mãe Preta” e evoluíram bem, como, aliás, toda a escola. O desfile terminou com a passagem do carro Moro Num País Tropical e com a Estácio sendo literalmente ovacionada na Praça da Apoteose. Foi um momento inesquecível dos desfiles, que ultrapassa os pequenos deslizes na concepção de algumas alegorias.


Empolgação não faltou aos integrantes da Unidos da Tijuca

UNIDOS DA TIJUCA – “Guanabaram - O Seio do Mar”, do carnavalesco Oswaldo Jardim, foi o enredo da escola em 1992. Utilizando-se da mesma fórmula do ano anterior, Oswaldo Jardim elaborou um carnaval leve e colorido e abriu o desfile com interessantes estilizações de caramujos na comissão de frente e nos quatro quadripés que antecederam o abre-alas, que teve o pavão, símbolo da escola, decorado com conchas e mariscos. As primeiras alas não me agradaram muito, pois a combinação de cores e formas não era das mais sedutoras. Gostei do segundo carro, que reproduzia uma cachoeira e tinha a predominância de tons de verde e azul, causando um bom efeito, principalmente pela adequação dos destaques de composição à alegoria. No geral, em termos plásticos, foi um desfile de altos e baixos, inferior ao do ano anterior, mas a correção da harmonia e o bom entrosamento das alas fizeram com que a Unidos da Tijuca fizesse uma passagem agradável. Os integrantes da bateria se vestiram de cavalos marinhos para representar “A Nobreza do Fundo do Mar” e entraram no boxe de uma forma primorosa, além de manterem com categoria o ritmo durante todo o desfile. Edmar e Juju Maravilha defenderam o pavilhão com elegância, trajando fantasias brancas. No Carro do Cassino da Urca o destaque principal ficou por conta de Hermínia Paiva, que desfilou uma belíssima fantasia azul. As baianas, vestidas de azul e branco, representaram iaôs e homenagearam Iemanjá. Fechando o desfile apareceu o carro que retratava um piquenique na Ilha de Paquetá. Com cerca de 2800 componentes, a escola passou sem abrir buracos e fez um bom desfile, apesar das irregularidades do visual.


A Mocidade mostrou os "Delírios do Sonho Colorido"

MOCIDADE INDEPENDENTE DE PADRE MIGUEL – Cercada de muita expectativa, a bicampeã do carnaval entrou na pista disposta a buscar o tricampeonato. Passava da meia-noite e meia quando os guardiões do sono (Anjos da Noite) da comissão de frente começaram suas ágeis evoluções. O samba era um dos melhores do ano, mas, infelizmente, não foi cantado como deveria, haja vista o mau gosto de alguns membros da equipe de intérpretes, que insistiam em soltar pérolas do tipo: “Aí eu vou pra galera...” e outras coisas do gênero. Detestei! Além dessas preciosidades, achei o ritmo um tanto quanto acelerado. Ritmo à parte, o fato é que o público ficou embasbacado com as inovações apresentadas pelos carnavalescos Renato Lage e Lílian Rabello. O enredo “Sonhar Não Custa Nada! Ou Quase Nada...” foi uma criação que permitiu aos carnavalescos grandes vôos de inventividade. O carro abre-alas, cheio de luzes e movimentos, representou a “Infinita Noite dos Sonhos”. Atrás da segunda alegoria, que era gigantesca e cheia de movimentos especiais, apareceram alas em tons de verde e preto que causaram um grande impacto. Estava muito interessante a ala vestida de rosa alusiva a “Aura dos Sonhos”, que precedeu o carro Contatos com Outra Dimensão, no qual Marlene Paiva foi a principal destaque. Gostei bastante do colorido da ala que vestiu a fantasia Delírio Psicodélico, que desfilou logo à frente da maravilhosa bateria de Padre Miguel. O setor que eu mais gostei, no entanto, foi o dedicado ao sonho infantil. Era belíssimo, tanto pela representação das alas, como, principalmente, pela passagem de um dos carros alegóricos mais bonitos que eu já vi em desfile. A alegoria, de concepção e realização impecáveis, representava um colorido parque de diversões, com direito a roda gigante, carrossel, soldadinhos de chumbo e outras maravilhas que povoam a mente das crianças. Os sonhos eróticos também foram representados no desfile. Neste setor sensual eu destaco uma bela ala vestida em fúcsia, dourado e preto. Na exibição do quadro “Perturbação do Sono”, com destaque para a concepção dos pernilongos do carro Mosquitada Desvairada, a criatividade dos carnavalescos ficou mais uma vez evidenciada. As baianas, vestidas com a fantasia “Despertar de um Novo Dia”, esbanjaram beleza e elegância em suas roupas douradas e alaranjadas, com elementos decorativos remetentes ao sol. O desfile, que foi muito bem recebido pelo público e pela crítica, credenciou a Mocidade como uma das fortes favoritas ao título. Em termos plásticos a escola só não foi melhor que a Unidos do Viradouro, mas, cada uma, ao seu estilo, foi perfeita na apresentação de três quesitos de responsabilidade dos carnavalescos: Enredo, Fantasias e Alegorias.


Abre-alas da União da Ilha

UNIÃO DA ILHA DO GOVERNADOR – Prejudicada por uma queda parcial de energia elétrica, a Ilha entrou na pista pouco antes das duas horas da madrugada de terça, disposta a enfrentar a penumbra e a brigar por uma boa posição. Com o enredo “Sou Mais Minha Ilha”, do carnavalesco Luis Fernando Reis, a escola, liderada por um personagem de nome engraçado: “Insulano de Tal”, fez um passeio pelas ilhas mais famosas de todo o mundo e descobriu que o melhor lugar é mesmo a Ilha do Governador. A comissão de frente representou o teatro Kabuk e foi formada por bailarinos trajados com uma bela fantasia nas cores da escola. O abre-alas apresentou cavalos marinhos e a primeira ala das baianas fez alusão à própria escola, com uma bela representação do brasão da Ilha. Os primeiros carros não me agradaram; eram muito simplórios e quebravam o conjunto visual. Ainda sob a frustração de ter que desfilar com menos luz do que as outras agremiações, os componentes da Ilha foram surpreendidos, quando a comissão de frente estava próxima ao centro da pista, por uma queda de energia total, que deixou a Sapucaí completamente às escuras. Por sorte a iluminação foi sendo restabelecida de forma gradativa e, antes mesmo que o abre-alas atingisse a rua onde fica o recuo da bateria, a iluminação já era bem melhor que a existente no início do desfile. As alas, com fantasias criadas por José Félix, estavam emplumadas e a maioria delas estava de muito bom gosto. Eu adorei a ala de Taiwan, que foi mostrada com máscaras de rara beleza em um jogo de cores muito bonito. O Carro de Madagascar foi um dos mais alinhados do desfile, com destaques bem fantasiados e muito adequados ao tema. Outro carro de impacto foi o do Japão, todo trabalhado em vermelho, pink e dourado. Aliás, seguindo o carro apareceu uma ala belíssima, representando o ritual do quimono. A ala alusiva ao Oceano Pacífico estava também muito bonita e desfilou antes do Carro da Ilha de Manhattan. A Ilha de Itaparica foi representada no enredo através de uma das alas de baianas mais bonitas do ano; era uma ala enorme, com elementos decorativos dourados referentes à Iemanjá. A bateria de mestre Paulão deu o show de sempre, mas, por pouco, não é prejudicada pelo erro na manobra de entrada no boxe, quando os tocadores de tamborim hesitaram em tomar seus postos. A Ilha Grande foi mostrada no enredo através de uma bem planejada ala referente ao jogo. O último carro, cuja concepção não era das melhores, prestou uma homenagem à própria União e a seus fundadores. O desfile alegre da escola terminou com mais um percalço: uma nova pane total no sistema energético deixou a pista novamente às escuras quando a bateria deixava o boxe. Lamentável!


A Portela buscou em seu pavilhão a inspiração para um belo desfile

PORTELA – Com as luzes da Sapucaí apagadas, Carlinhos Maracanã, presidente da escola, foi categórico ao ser questionado sobre a possibilidade da Portela iniciar seu desfile, como queria o presidente da Liga, Ailton Guimarães Jorge: “Sem luz eu não entro! Pergunta se ele entra na casa dele no escuro”. O fato é que enquanto a luz não foi totalmente restabelecida, o que levou cerca de 30 minutos, a escola realmente não entrou e, felizmente, os cronômetros não foram disparados. Somente às 3h43, com o Sambódromo totalmente iluminado, é que a Portela deu início ao seu esperado desfile. Com o enredo “Todo Azul Que o Azul Tem”, do carnavalesco Silvio Cunha, a escola de Madureira esbanjou luxo e beleza em suas fantasias e realizou um dos melhores desfiles do ano. A águia fez movimentos suaves e estava muito bem realizada. No carro Persa a Portela apresentou dois dos seus principais destaques: Pedrinho Martins e Wanda Batista. Eu gostei bastante das alas referentes ao azul do céu e ao azul do mar. Adorei o carro Sangue Azul, com seus espelhos, brasões, estandartes e coroas. Uma belíssima ala com a fantasia de “nobres puros”, com chapéus decorados com penas de pavão, antecedeu o bonito Carro dos Azulejos, que tinha Carlos Reis e Maria Monteiro como principais destaques. Atrás da alegoria surgiram alas que, em conjunto, proporcionaram um efeito visual muito bonito, através de seus tons que iam do azul claro ao violeta. No Carro dos Poetas, que surgiu a seguir, a destaque principal foi Martine. No último setor de seu desfile a Portela fez uma homenagem aos seus baluartes e relembrou suas glórias. O desfile terminou com um carro que mostrou a águia sobre a bandeira da escola, além de grandes fotos de Natal, Clara Nunes e Elizeth Cardoso. Os quase 5.000 componentes evoluíram sem hesitações e o samba cresceu muito durante o desfile, que acabou por volta das 5 da madrugada com um simpático e animadíssimo “arrastão”.

Final do Desfile de 92. Expectativa para conhecermos a campeã. Duas escolas, na minha opinião, disputariam o campeonato com mais força: Estácio e Mocidade. É claro que a Viradouro estaria incluída entre as duas (e com a minha preferência) caso não tivesse sofrido com os problemas já conhecidos do leitor. Além dessas escolas, havia possibilidades para Mangueira e Portela, que também fizeram apresentações elogiáveis.

Segundo a pesquisa do Ibope, que eu costumo não levar muito em conta, por considerar que a fonte pesquisada nem sempre é isenta ou conhecedora de carnaval, a Mocidade seria a campeã e a Viradouro ficaria em segundo. Eis as notas:


1º Mocidade – 9,7
2º Viradouro – 9,4
3º Mangueira – 9,2
3º Estácio – 9,2
5º Beija-Flor – 8,7
5º Portela – 8,7
7º Imperatriz – 8,5
7º Salgueiro – 8,5
9º Caprichosos – 8,3
10º Ilha – 8,1
11º Unidos da Tijuca – 7,8
12º Leão de Nova Iguaçu – 7,7
13º Vila Isabel – 7,7
14º Tradição – 7,6
15º Santa Cruz – 7,5

A apuração ocorreu, mais uma vez, na quarta-feira de cinzas, na Praça da Apoteose e, assim como no ano anterior, foram permitidas notas de 5 a 10, quebradas em meio ponto.

As primeiras surpresas aconteceram no quesito Samba-Enredo, no qual somente a Mangueira, o Salgueiro e a Estácio obtiveram notas máximas de todos os jurados, o que, a meu ver, foi um equívoco, já que essas escolas não tinham os melhores sambas do ano. Até a leitura das notas do sexto quesito (Conjunto) a Estácio liderava a apuração, com o Salgueiro e a Mangueira em segundo e a Mocidade em terceiro. Na leitura das notas do quesito Alegorias e Adereços as coisas começaram a mudar, principalmente após as notas do rigoroso julgador Juciê Mendes, que deu notas baixas para várias escolas, inclusive para a Mangueira (7,5) e para o Salgueiro (9,0). O segundo julgador também tirou pontos do Salgueiro e da Mangueira e, a partir de então, a Mocidade assumiu a segunda posição. No quesito Fantasias seis escolas obtiveram notas máximas de todos os julgadores: Mangueira, Imperatriz, Viradouro, Estácio de Sá, Mocidade e Portela. No quesito Comissão de Frente somente a Imperatriz (que começava a surpreender) e a Portela obtiveram notas máximas dos três jurados. Cinco escolas conseguiram pontuação máxima no quesito Mestre-sala e Porta-bandeira: Imperatriz, Viradouro, Estácio, Unidos da Tijuca e Mocidade. O resultado final consagrou o desfile mais empolgante do ano como o campeão: deu Estácio de Sá, para a felicidade do puxador Dominguinhos, que passou toda a apuração à beira de um ataque de nervos.


O resultado geral foi o seguinte:

1º Estácio de Sá – 298, 5 pontos
2º Mocidade Independente – 297
3º Imperatriz Leopoldinense – 294,5
4º Acadêmicos do Salgueiro – 294
5º Portela – 292,5
6º Mangueira – 292
7º Beija-Flor – 288
8º Unidos da Tijuca – 284,5
9º Unidos do Viradouro – 281,5
10º União da Ilha – 280
11º Caprichosos de Pilares – 279
12º Vila Isabel – 270,5
13º Leão de Nova Iguacu – 270,5
14º Tradição – 264
15º Santa Cruz – 236,5

Vale lembrar que a Beija-Flor, por desrespeitar um dos itens do regulamento, perdeu dois pontos e a Viradouro, pelo atraso em seu desfile, perdeu 13 pontos. Aliás, sem a perda dos pontos a Viradouro chegaria em terceiro lugar. Imagine se a escola não tivesse sido prejudicada em sua evolução e harmonia pelo incêndio!

No Desfile das Campeãs desfilaram sete escolas. A Unidos da Ponte (vice-campeã do Grupo 1) abriu o espetáculo. Em seguida foi a vez da Grande Rio (campeã do Acesso), que voltou a encher a pista com seu grande número de componentes e suas enormes alegorias. A Portela foi a primeira das grandes escolas a pisar no asfalto da Sapucaí. Vale destacar a bonita homenagem que a escola fez à Estácio de Sá. A águia, além do “grito” tradicional, proferiu uma frase: “Parabéns Estácio de Sá”. Em seguida desfilaram o Salgueiro, a Imperatriz, a Mocidade e a Estácio, que foi saudada com um foguetório incrível.


Para terminar, quero agradecer ao amigo Luciano Pietrosanto Maia, que foi quem cedeu as fotos que ilustraram esta coluna.

Marcelo Guireli

marguireli@uol.com.br