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Coluna da Denise

UMA HISTÓRIA SEM FINAL

15 de setembro de 2008, nº 13, ano I

Hoje minha coluna tem endereço certo. Um pouco longínquo, mas quero dedicar essa coluna ao Grêmio Recreativo Escola de Samba Acadêmicos de Santa Cruz. Por dois motivos. O primeiro é imediato, pelo fato de alguns torcedores apaixonados pela agremiação terem realizado um trabalho de qualidade ao colocar no ar um sítio que já desponta como um dos melhores em termos de escolas de samba, o http://academicosdesantacruz.com.br. O segundo, mediato, em razão de a escola estar comemorando em fevereiro próximo o seu jubileu de ouro.

E olha que a Santa Cruz tem história pra contar. Se em sua primeira apresentação no bairro houve a promessa de "tacar fogo", quando a escola resolveu atravessar os trilhos do progresso para chegar à Praça XI, nascia ali um marco para o bairro e para o carnaval, pois, nada obstante a Zona Oeste já possuir algumas representantes no desfile, a Santa Cruz veio com vontade de se tornar uma grande escola.

É lógico que a escola enfrentou preconceitos. Durante anos, foi estigmatizada como a escola da última estação, do subúrbio mais longínquo do centro carioca, mas a Santa Cruz foi guerreira e soube administrar as dificuldades e, o que é melhor, soube esperar, pois construiu sua história de forma independente, digna e segura.

Fato é que, já em 1963, a escola mostrou que não vinha para brincadeira, e faturou em seu primeiro campeonato junto às outras agremiações cariocas e subiu de grupo. Novo campeonato não demorou a acontecer. Em 1965, pelo Grupo 2, no festivo carnaval do quatricentenário da cidade do Rio de Janeiro.

No ano de 1966, a Santa Cruz estreava no Grupo 1, hoje com a denominação de Grupo Especial. Fato que se repetiu por mais seis vezes, em 1970, 1985, 1990, 1992, 1997 e 2003.

É bem verdade que a escola não conseguiu fincar sua bandeira na elite do carnaval em nenhum desses anos, mas, superou dificuldades e colocou o bairro de Santa Cruz.na história dos desfiles cariocas.

Os Acadêmicos de Santa Cruz também podem ser considerados como a escola de maior regularidade na chamada segunda divisão do carnaval carioca. Dos seus oito títulos, cinco deles foram conquistados no grupo de acesso ao especial, o que a faz disputar com a Estácio de Sá (se considerarmos sua fase como Unidos de São Carlos), o titulo de escola que mais ascensão teve, por campeonato, ao grupo de elite na história dos desfiles.

Em pouquíssimo tempo superou a madrinha Unidos de Bangu, deixou a Unidos de Padre Miguel na poeira e assumiu, por méritos, a função de ser a segunda grande força representativa da Zona Oeste no carnaval carioca.

E a escola mostrou a sua cara no carnaval. Multifacetada. De contrastes. Erudita, popular. Heróica, anarquista. Sóbria, etílica. Boêmia. Crítica. Sacana. Exagerada. Corajosa. Clássica. Futurista.

Na rolança do tempo, a escola escreveu, através de seus enredos, páginas e mais páginas de cultura - por meio das artes, música e teatro; e de história do Brasil - Brasil, folclórico, do extrativismo à reciclagem. Amazonas, Bahia, Ceará, Brasília, Minas Gerais, São Paulo e o Rio de Janeiro.

O Rio Antigo, o Rio dos Vice-Reis, o Rio de todos os tempos e costumes. Até o Rio de Itaguaí.  

A escola também trouxe outras culturas. Refez a rota dos mercadores, desde os fenícios, passando pela Pérsia, Índia, China, Américas. África, Egito, Madri, Las Vegas, Grécia, China, Japão, Rússia, Paris também estiveram nesse roteiro cultural.

A Santa Cruz fez o seu papel no carnaval carioca. Vejamos.

- exaltou as mulheres, Dalva de Oliveira, Carlos Gomes e Braguinha muito antes de Portela, Imperatriz Leopoldinense, Unidos da Tijuca e Estação Primeira de Mangueira;

- ousada, invadiu a “praia” da sociedade carioca e assumiu seu lado fútil e cafajeste, ao homenagear Ibrahim Sued;

- sob a proteção dos orixás, mostrou o candomblé, levando o terreiro para a avenida;

-  passeou por todos os espetáculos do mundo e provou que o maior deles é o carnaval carioca;

- clamou por liberdade em dois momentos históricos de nossa história, dos inconfidentes aos heróis da resistência;

- fez da conexão Santa Cruz - França um momento de encanto e sedução.

Por ironia do destino, ela própria sofreu o revés de, no apagar das luzes, ter visto um de seus sonhos sucumbir. Mas, escola que é guerreira, não esmorece. E quem pensava em calar a Santa Cruz, não calou. Como dizia o Stanislaw, também já homenageado pela escola, “quem não tem quiabo, não oferece caruru”.

E haja trevo de quatro folhas, banho de arruda, figa de guiné. Passados alguns anos, a escola volta a se envolver em mais uma polêmica no carnaval de 2002. Sabemos que a Vila não quer abafar ninguém, mas a Santa Cruz também quer mostrar que faz samba também.  Entre confete e serpentina, salve o sentimento do artista, que invade a alma do sambista e alegra o coração. Afinal, segura a pemba, pois a verde e branco é isso aí.

Eis a Santa Cruz, abençoada, imortal, patrimônio cultural. A escola que faz parte desse show maravilhoso que se tornou o carnaval carioca. E quanto ao futuro? Se o tempo é um mistério, quem saberá?  

“Vem plantar

Fazer o nosso amanhã florir

E reciclar a consciência

O futuro vai sorrir”

 

                  

O final dessa história não termina por aqui, pois a escola ainda tem um objetivo maior, e,  provavelmente, na próxima década,  uma nova página pode ser escrita pela Santa Cruz no carnaval carioca.

De certo, mesmo, a nossa percepção de que o show vai continuar. É Santa Cruz, vamos aplaudir! Só merece a voz do povo, quem já fez por merecer. Parabéns, Santa Cruz!


denisefatima@gmail.com

Observação: esta coluna é uma homenagem ao André Ribeiro, um santa-cruzense da melhor qualidade.