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Coluna do Cláudio Carvalho

O QUE TERIA ACONTECIDO COM A EM CIMA DA HORA?

Passado o carnaval, aproveito o espaço dessa coluna para levantar uma bola que anda murcha faz tempo. Afinal, o que teria acontecido com a escola de Cavalcanti se, em 1976, a história tivesse sido diferente?

Pra começo de conversa, um pouco de história. O GRES Em Cima da Hora nasceu de um bloco carnavalesco de Cavalcanti. Reza a lenda que, no ato da fundação, não se chegava a um acordo quanto ao nome da agremiação, e a discussão já se estendia pela madrugada. Eram três horas da manhã, quando um participante exclamou: "Tenho que me retirar, está em cima da hora". Daí teria surgido o nome e o símbolo da escola: um relógio marcando três horas. A versão oficial, porém, é de que o nome teria sido copiado de um bloco do qual Baianinho (autor de inúmeros sucessos da MPB) freqüentava, se não me engano, em Del Castilho. 

Além do famoso compositor citado, a escola já teve em seus quadros gente do porte de João Severino, Ney Vianna, Carlinhos de Jesus e, mais recentemente, Rogerinho e Tiãozinho Cruz, além do jornalista Sérgio Cabral, confesso torcedor que chegou até a ser homenageado no carnaval de 1997. Em sua safra de sambas-enredo, figuram hinos do porte de "Bahia, berço do Brasil" (72), "O saber poético da literatura de cordel" (73), "A festa dos deuses afro–brasileiros" (74), "33, destino D.Pedro II" (84), "Me acostumo,mas não me amanso" (85), "Yara cigana, canta, dança e toca, é Rio, é rua, é carioca" (96), e muitos outros. Deixei o melhor deles ("Os sertões") por último propositalmente. A obra–prima de Edeor de Paula servirá de pano de fundo para a discussão que pretendo implantar com essa coluna. Portanto, vamos a ela.

Reportemos–nos então ao ano de 1973. Nesse ano, a afilhada da Portela trouxe para a avenida um belíssimo samba, num dos melhores desfiles de sua história, fazendo frente às quatro grandes da época e alcançando um honroso sexto lugar. Achava-se que ela iria crescer, pois a cada ano saía melhor. Os mais exaltados diziam que ela havia vindo pra ficar. 

O sucesso, porém, não se repetiu nos anos que se seguiram, mas o desânimo não tomou conta dos componentes da escola. Até que chegou 1976.

Naquele ano, as grandes já não eram mais as mesmas. A Portela se ressentia pela falta de Natal, o Império vinha numa descendente que o levou ao rebaixamento em 78, a Mangueira estava mal das pernas e o Salgueiro havia acabado de perder Joãozinho Trinta para a Beija–Flor, a única apontada como capaz de tirar o título de Cavalcanti. Sim, porque, às vésperas do carnaval, a Em Cima da Hora se preparava para cantar o samba–enredo que é considerado por muitos o melhor de todos os tempos, e a repercussão foi para lá de positiva no barracão da escola. Dizem por aí que quem entrava lá ficava maravilhado com o que via, e que o título seria pule de dez. O imponderável, porém, aconteceu. Por algum motivo pouco explicado (uns dizem que o prédio era da União, outros que era tombado) nada poderia ser retirado do barracão, e as alegorias permaneceram lá sem poderem ser utilizadas no desfile. Os componentes da escola, na surdina, levaram o que puderam para o desfile, numa tentativa de evitar o pior. 

Depois da tempestade, veio a outra tempestade. Literalmente falando. No dia em que a azul e branco colocou o bloco na rua, desabou um toró de proporções épicas, e seus componentes, marcados pela própria natureza, desfilaram com água no joelho. Resultado: o melhor samba-enredo de todos os tempos foi parar no fundo do Mangue, local do desfile. A Em Cima da Hora, juntamente com Lins Imperial, Lucas e Tupi de Brás de Pina, foi rebaixada, e desfilou pela penúltima vez dentre as grandes (a última foi em 85).

Em 2000, a escola ensaiou um retorno ao desfile principal e disputou o acesso ponto a ponto com a Paraíso do Tuiuti. A disputa foi tão acirrada que os componentes da escola de São Cristóvão chegaram a ir cumprimentar os dirigentes azul e branco, quando foram informados que eram eles que haviam subido. Daí em diante, Cavalcanti caiu no ostracismo e a escola foi caindo de grupo até chegar ao D, onde se encontra atualmente e desfilou em 2005 obtendo um modesto quarto lugar. 

Mas, e se em 76 as profecias tivessem se confirmado? Ora, a Em Cima da Hora teria sido a primeira a furar o bloqueio das grandes, e tal façanha poderia significar uma projeção inimaginável para a escola. Exagero a parte, imaginem só, que hoje poderíamos estar escutando: "...em nome do pai, do filho, Cavalcanti é guarani...". Pois é, o mundo dá voltas, e não há nada como um dia após o outro. Um dia é da caça, e o outro é do caçador. Reflitam sobre isso!

Cláudio Portela

claudioarnoldi@ig.com.br