Silvio teve que rebolar para se justificar sobre os perdidos
O programa não existe
mais! Foi apenas mais uma das trocentas e infinitas
atrações comandadas por Silvio Santos no SBT. Certamente,
ninguém lembra que a dita atração existiu,
tampouco sobre no que consistia. Seu nome era "21".
Mas há
uma legião de chavesmaníacos que se recorda do referido
programa, que na verdade era um jogo de perguntas e respostas sobre
determinada atração ou personalidade. E eis que um
fã de "Chaves" e "Chapolin", escalado para participar da
sabatina sobre os programas de Roberto Gómez Bolaños,
ficou frente a frente com o homem. Mesmo com a presença de
ninguém menos do que Senor Abravanel em pessoa à sua
frente, o jovem Rogério Favo não titubeou. Ao ser
indagado pela primeira vez pelo dono do Baú, o futuro sósia do
Quico, sem qualquer temor, emendou: "Silvio, quando veremos novamente
os episódios perdidos?". Lendário na TV há quase 50 anos,
uma das maiores personalidades brasileiras do Século XX, Silvio
Santos sentiu um nítido desconforto perante àquela
pergunta inesperada. Evidentemente sem estar a par daquilo a que era
questionado, o apresentador, após desconversar rapidamente num
primeiro momento, achou uma solução criativa e bem
humorada para deixar tal situação embaraçosa:
"Perdidos? Não, ainda não encontramos...".
Silvio
provavelmente desconhece as queixas dos chavesmaníacos a
respeito dos episódios perdidos, cuja nomenclatura foi definida há mais de uma
década, em tempos que a Internet por aqui engatinhava e
não se tinha nenhuma informação relevante sobre os
programas e os episódios que um dia foram apresentados
regularmente e que, inexplicavelmente, tiveram suas
veiculações canceladas com o passar do tempo.
"Os Espíritos Zombeteiros": chances de voltar são grandes
Bem que eu me
recordava, na infância, ter presenciado uma ocasião
em que Seu Madruga, no auge do sono, mas com pleno corpo em
movimento, conduzia pratos até o barril do Chaves
com os braços esticados. Lembro-me de perguntar à minha
mãe, mesmo balbuciando algumas palavras, o motivo pelo qual o
pai da Chiquinha se encontrava naquele estado. Aí aprendi o que
era ser um sonâmbulo! Tempos depois, perceberia que aquele tal
episódio em que Madruguinha era vitimado pelo sonambulismo nunca
mais dera as caras no SBT. Teria eu tido, no coração de
uma criança, uma ilusão "ótima"?
A resposta
para aquele mistério tão curioso quanto o dos pratos que
desapareciam da casa de número 72 viria de imediato nos
primeiros sites CH da Internet, como o Aí Vem Eles, Chaves
e Chapolin, Tinha que ser o Chaves!, Tributo a Chespirito, Chaves
Online, entre outros. Sabia que não tinha sido um obscuro
devaneio... Eu realmente tinha visto em certa ocasião, numa de
minhas primeiras lembranças televisivas da qual tenho
memória, Seu Madruga sonâmbulo com um prato na mão
ao som de uma música sinistra.
Cartoon Network: uma das mais tradicionais emissoras de animação em TV por assinatura
Era idos de
2002. Até aquele momento, imaginava que eu era a única
pessoa da face da terra aficionado pelo trabalho de Roberto
Gómez Bolaños. Nunca imaginaria estar envolto por uma
representativa legião que faria história com o passar dos
anos. Naquela oportunidade, recém começava a me deparar
com tal devoção de contornos religiosos e
dimensões infindas. Era minha primeira postagem no Fórum
da CHBR, embrião do atual FUCH. Na oportunidade, já
integrava o Fórum do Aí Vem Eles,
o primeiro site CH
da história, fundado em 1999 e no ar até hoje. Naquela
outra ferramenta opcional, meu primeiro tópico trazia a
seguinte questão: "Por que nenhuma emissora de TV a cabo exibe
Chaves?". Era algo que já me intrigava, mesmo sem ter comido
trigo algum. Ninguém soube responder, é claro!
Passaram-se os
anos... A banda larga se espalhou, episódios em alta
qualidade passaram a estar disponíveis em detrimento aos
perdidos em baixa resolução, enfim comprovou-se
que acidente de avião nenhum havia matado os atores...
Enfim, todos os mistérios foram esclarecidos. Menos, é
claro, a questão dos perdidos!
Antes do CN, "Escolinha" fora mencionado por Sônia Abrão no "Falando Francamente"
A
incredulidade tomou conta de vez dos chavesmaníacos, quando o
extinto "Falando Francamente" de Sônia Abrão
começou a apresentar especiais com episódios de "Chaves",
nos quais perdidos como "Pichorra", "Os Espíritos Zombeteiros" e
os até então nunca apresentados pelo SBT "As Apostas" e
"Brincando de Escolinha". O próprio locutor do quadro Lombardi
Jr, como se estivesse munido de um punhal, admitiu que tais
episódios "não eram mais exibidos". Motivos
especulados não faltavam, como "incêndio no
acervo da emissora", "censura" e "qualidade da imagem". Mas a causa,
motivo, razão ou circunstância pelo cancelamento da
leva... e principalmente pelo retorno de oito perdidos do "Chaves" em
2003 e mais um em 2007, além das dezenas de inéditos do
"Chapolin" apresentados entre 2005 e 2008... Tchuin tchuin tchum clain!
Um movimento
fora criado pelo colunista do Portal Chaves, Valette Negro: o Volta-Perdidos CH & CH. A intenção era esclarecer
para o público a polêmica mal-explicada de tantos
episódios de "Chaves" e "Chapolin" que sumiram de repente, com
alguns regressando inesperadamente e outros situados num eterno limbo.
Um brilhante documentário foi produzido por Valette (visto aqui), juntamente
com uma esclarecedora, detalhada e muito bem articulada entrevista ao
site da Folha (audível aqui). Naturalmente, nenhum resultado foi gerado pelos lados do
SBT em termos dos clássicos perdidos de "Chaves". Pelo
contrário: "Chapolin" fora cancelado pela emissora em maio de
2009, não passando em rede nacional desde setembro de 2003... e
"Chaves" ficara restrito aos paulistanos sem programação
local às 12h45min, com os mesmos episódios de sempre.
TLN e o "avant-premiére" na véspera da estreia do Cartoon: "O Bilhete de Loteria"
Eis que, como num
repente do "Velho Lobo" Zagallo e sua frase que virou bordão
televisivo "Aí sim, fomos surpreendidos novamente!",
eis que
surge o Cartoon Network. Tal qual uma Fênix garbosa cujo
retrovisor observa as cinzas se distanciarem, após
tempos de marasmo que seriam quebrados só com as visitas de
Carlos Villagrán e Edgar Vivar ao Brasil em abril, a
esperança dos fãs traduzida na Pasárgada
meteórica daquele setembro de 2003 raiou mais do que nunca. Uma
das mais
tradicionais emissoras de TV por assinatura - que já veiculava o
desenho do "Chaves" há algum tempo - fechara contrato com a
Televisa para exibir os seriados. Já havia a TLN, pertencente
à própria emissora mexicana, porém ainda ausente
na maioria das operadoras e com exibições regulares de
"Chaves" e "Chespirito" apenas nos finais-de-semana. Mas ainda parecia
pouco! Teríamos um prenúncio em pleno dia eleitoral: "O
Bilhete de Loteria" (2ª versão), perdido desde 1992, seria
o primeiro cancelado pelo SBT exibido pela TLN. A um dia da sonhada
estreia no Cartoon. Coincidência?
Chegamos a
novembro! Foi preciso o Brasil eleger uma mulher na presidência -
algo impensável nas décadas anteriores - para o
sonho da volta dos perdidos despontar. Naquela manhã de
segunda-feira, enquanto as manchetes dos jornais recém
saídos do forno questionavam se o correto é "presidente"
ou "presidenta" (sendo que, na verdade, o correto era "eu a convidei"),
a nação chavesmaníaca estava envolta pela
expectativa. O devaneio acalentado no já longínquo 2002
no "debut" no Fórum CHBR deixava de ser apenas um mero e reles devaneio. E para
consolidar o famoso ditado "dois coelhos numa só cajadada": o
que víamos de cara era... um episódio inédito.
Nunca exibido no Brasil. A não ser nos já referidos
especiais do "Falando Francamente" em 2003. Antes, mais uma vez a frase
de Zagallo ecoou em nossas mentes: uma abertura original dublada por
Tatá Guarnieri, atual voz do Chaves no desenho animado, com a
BGM do desenho animado como fundo.
"As Apostas" marcou a estreia no Cartoon: um inédito
"As Apostas",
um curto entremés de menos de quatro minutos só com
Chaves e Quico, começara um pouco antes do horário
previsto, às 9h30min. Mas já deixava o telespectador com
a inevitável sensação de incredulidade.
Sensação que se perduraria com a sequência
seguinte: a abertura narrada em espanhol, "Ladrões
Espertos" (com Chompiras e Peterete), "Brincando de Escolinha" - uma
trinca jamais apresentada pelo SBT - e, por fim, os créditos
finais, ausentes da TV brasileira desde 1984. O dia 1º de novembro
de 2010 já fazia parte dos anais dos 11 anos do meio CH no
país.
Créditos finais se tornariam corriqueiros no Cartoon
Após a
reprise da trinca às 20h, a tão sonhada volta de
"Chapolin" ocorria 35 minutos depois. Mais precisamente às
20h35min, mais uma vez Tatá dublava a abertura, agora do
Chapolin. As imagens da saga da Branca de Neve na abertura davam a
impressão de que o Cartoon estrearia a série justamente
com sua mais famosa e lembrada saga. Porém, outro curto esquete
marcaria o começo dos trabalhos: "Parabéns, Sargento",
seguido por "O Julgamento" e "O Bandido Mata-Fácil". A mesma
abertura seria aproveitada nos dias seguintes. Isto, mais o fato de
não haver opção de áudio original em
espanhol, considerei os únicos poréns da
exibição do CN. Seria mais fácil manter a abertura
original de cada episódio, com a locução em
espanhol - que só vazou no primeiro dia porque a abertura
mexicana foi colocada entre "As Apostas" e "Ladrões Espertos".
Sai-de-Trás e "Jogando Bola": perdidos desde 1988 e 1990, respectivamente
E assim a
comunidade chavesmaníaca voltou a se entrelaçar como nos
bons e velhos tempos, acompanhando as exibições
diárias com expectativas até então sempre
comprovadas. Três dias depois, seria a vez de "Quem será o
Novo Chefe?", ausente desde 1988 onde, inacreditavelmente, Peterete
chama Chompiras de Sai-De-Trás. Já não bastava
Beterraba, Baixinho, Chaveco e o nome original... Na manhã
seguinte, mais uma proeza do Cartoon: "Jogando Bola". Exibido uma
única e minguada vez, no distante 1990.
Agora sim
Silvio Santos, quando reencontrar Rogério Favo, terá uma
resposta para sua questão inquietante, no entanto mais
incômoda: basta sintonizar no Cartoon Network. A Pasárgada
há muito deixou a teimosia do SBT e, contrariando todas as
tendências num quê quixotesco, reedita a Fênix
chavesmaníaca desembarcando no Cartoon. Que seja um casamento
duradouro com muitos perdidos e inéditos pela frente!
Sai-De-Trás que lá vem pedra...