ADAPTAR OU NÃO ADAPTAR? EIS A QUESTÃO!

            Há alguns dias li uma coluna do Arthur Campos, que falava sobre a dublagem. E ele revelou que preferia que os textos fossem traduzidos para o português sem alterar o texto da língua original. E desde então refleti e minha conclusão foi que essas alterações, adaptações no texto original para o português, são imprescindíveis para manter o humor do programa, caso ele chegue a referir-se a um assunto regional, fora do conhecimento de uma outra região. Em alguns casos, isso não poderá ser feito. E procurarei esclarecer os detalhes deste curioso assunto citando exemplos.

            Obviamente a adaptação é necessária para fazer o público brasileiro rir com piadas sobre coisas brasileiras, que entendemos muito bem. Se fizessem uma piada sobre personalidades, fatos mexicanos ou de qualquer outro país e fosse traduzido ao pé-da-letra, não teria graça, pois o público não entenderia (talvez os historiadores sim). Mas há exceções, como nos filmes, onde são mostrados em muitos deles os costumes norte-americanos e, principalmente, sua história. Aí não teria nexo, por exemplo, o dublador resolver fazer essas adaptações brasileiras num personagem que irá fazer um pronunciamento em frente a uma bandeira norte-americana, dizendo assim: “Cidadãos brasileiros...”. Entendem o que eu quero dizer, né?

            Outro exemplo, agora chavesmaníaco, foi o citado pelo Arthur na sua coluna. No primeiro episódio da série sobre a viagem da turma à praia, eles sempre se referiam a essa praia como Acapulco, uma das mais populares cidades litorâneas do mundo, situada no México. O nome Acapulco já havia caído na boca da galera, quando no segundo episódio, o grande furo foi cometido: resolveram adaptar o texto mexicano colocando nomes brasileiros. E o resultado acabou decepcionando os fãs brasileiros, que não acharam engraçado os tradutores terem trocado em cima da hora “Acapulco” por “Guarujá”. E os tradutores vacilões “capricharam” mesmo ao fazer a pobre Chiquinha dizer que o Seu Barriga tinha um cortiço em São Paulo... Pelo menos aí o Arthur estava certo, pois seria como trocar em um episódio dos Simpsons o nome Springfield por Bauru (duas cidades do interior, faria sentido).

            Esse caso talvez seja a única exceção no caso da tradução adaptada. Porque é muito mais gozada uma série de piadas sobre fatos brasileiros do que mexicanos, pois para nós será mais compreensível entender do que falam. Vai que, numa novela brasileira vendida para o exterior, haja um diálogo sobre a morte do PC Farias. Duvido que alguém lá de fora saiba quem é essa pessoa, por isso eles alteram diálogos como este, botando no lugar um assunto referente ao seu país, pois assim o público irá pegar o assunto e entendê-lo completamente.

            Em vários episódios de Chaves e Chapolin, aconteceram essas alterações: o exemplo mais lembrado é referente às diversas aulas de história onde a dublagem trocou a história mexicana pela brasileira (e fizeram um bom trabalho). No episódio da Recuperação, um dos últimos da série clássica a ser dublada, a dublagem deu uma canja para a história mexicana, já que falar do Brasil já estava manjado. E o resultado foi um dos episódios mais gozados da história do Chaves. Claro que no próprio episódio entrou em cenas as adaptações como: “O conquistador do México foi Tarcísio Meira, Chiquinho Scarpa, Jece Valadão...”, nomes conhecidos para os brasileiros. Se pusessem os nomes de artistas mexicanos (que provavelmente não conheceríamos), iríamos perguntar: “Isso tem graça?”.

            Tamanho o esforço dos tradutores para adaptar o texto, erros históricos são cometidos: como no episódio do Dia da Independência, onde Chaves diz que Dom Pedro I carregou uma enorme pedra pelas costas e “andarilhou” até o templo. Na verdade, isso aconteceu com Calabar, um dos heróis mexicanos, que, aliás, no episódio da Troca dos Chapéus, entrou em cena. Chiquinha perguntou se Chaves não queria brincar de Guerra dos “Farrapos”. Aí falou para o Chaves que ele seria o Calabar (e você a calabresa!). Perguntinha: Calabar por acaso participou de Guerra dos Farrapos? Talvez ele nunca tenha ouvido falar no Brasil... Para completar, Chaves ainda simulou o ato de carregar a pedra nas costas também neste episódio, desta vez dizendo que fora Calabar quem executou tal ato. Mas nem por isso as piadas ficaram menos engraçadas.

Para citar mais adaptações de sucesso, vamos a uma, por incrível que pareça, criticada pelo Arthur, que foi a da parte final do episódio do Lobisomem, onde Chapolin lê no jornal: “Corinthians ganhou do São Paulo por 3x1”. Todo mundo ri desta piada. Agora e se traduzissem ao pé-da-letra, com os times mexicanos (Ex: Toluca ganhou do Chivas Guadalajara...), seria bem menos engraçado, não acham? Eles fizeram mais ou menos isso no primeiro episódio do Julieu e Romieta (Palmeiras! América, América, rá, rá, rá!). Poderiam botar no lugar de América um Corinthians ou um São Paulo, mas o América foi necessário devido ao rá, rá, rá de Carlos Villagran. Mas o América acabou sendo bastante cômico, foi provavelmente uma tradução ao pé-da-letra do original que deu certo (ou o tradutor torcia para um dos milhões de Américas que existem no Brasil).

Saindo um pouco do Chaves indo parar no Simpsons, série mais patriota do mundo, pois em todos os episódios não deixam de falar que são os tais, por isso que as adaptações de fatos americanos para brasileiros são escassas (lembrando que seria ridículo aparecer o Michael Jackson no desenho e eles traduzirem como se ele fosse o Neguinho da Beija-Flor). Porém elas, quando apareceram, fizeram sucesso na parte em que o Bart passa aqueles trotes telefônicos para o Moe. Por exemplo, o do Jacinto Pinto. No original, o nome que o Bart dá é Jock Strap. Alguém aqui riria deste nome? Que graça os alcoólatras do desenho viriam neste nome, se fosse traduzido ao pé-da-letra aqui no Brasil? Esse nome tem um certo significado lá para os americanos. E para nós, Jacinto Pinto tem um significado cômico que entendemos muito bem e rimos disso. Por isso a adaptação é necessária. Outras adaptações de trotes: Mike Rotch para Décio Pinto, Hugh Jass para Idi Ota, e assim vai: troca de nomes sem nexo para nós por nomes mais compreensíveis e, claro, com significado mais cômico. Quando traduziram exatamente como no inglês, não teve graça, como no Amanda Beijo-e-Abraço, original Amanda Hugginkiss. Ao pé-da-letra, mas sem graça. E para completar, a única adaptação que me lembro que fizeram na série foi num daqueles episódios de Dia das Bruxas, quando fizeram a dubladora da Marge dizer que tinha Domingão do Faustão na Globo (e hoje o SBT é que exibe a série, ou seja, o episódio com essa fala jamais será exibido na emissora de Sílvio Santos).

Entendeu, meu caro amigo Arthur Campos, porque na maioria dos casos a adaptação do texto original é necessária? Claro que não podemos adaptar tudo, por motivos citados acima (talvez a tua intenção tenha sido criticar as adaptações mal-sucedidas, como no episódio de Acapulco, e depois pisaste na bola ao dizer que é um erro substituir assuntos internacionais sem graça por assuntos do nosso país, mais engraçados e mais compreensíveis). Ele com certeza entendeu, porque ele mesmo admitiu que não gostou do que comentou sobre a dublagem e as adaptações. Assim como eu, ele deve ter refletido.